Por Elizeu Dionizio.
Impactos no Setor Produtivo e Reflexões no Contexto Econômico Brasileiro
Introdução
A crise econômica que assola o Brasil nos últimos anos tem resultado em um aumento expressivo de empresas buscando a recuperação judicial (RJ) como uma solução para suas dificuldades financeiras. No entanto, o crescimento do uso desse mecanismo revela uma aplicação muitas vezes inadequada, desconsiderando as consequências a longo prazo para a cadeia produtiva, o sistema judiciário e a economia. Quando mal compreendida e aplicada, a recuperação judicial pode restringir o crédito da empresa e de seus sócios, causando uma paralisia das atividades econômicas e comprometendo a sustentabilidade do negócio.
Por outro lado, o sistema cooperativo, especialmente no contexto de estados como Mato Grosso do Sul, cuja economia é fortemente baseada no agronegócio, oferece um modelo de relacionamento econômico diferenciado. As cooperativas de crédito, com sua estrutura baseada no ato cooperativo, emergem como uma alternativa importante. Compreender as nuances e os benefícios do ato cooperativo, em contraste com a recuperação judicial, é essencial para refletir sobre as melhores práticas e soluções para o setor produtivo brasileiro.
Ato Cooperativo: Definição e Diferenças em Relação às Instituições Bancárias
Tradicionais
O ato cooperativo é definido pela Lei nº 5.764/1971 como a operação realizada entre a cooperativa e seus associados, ou entre cooperativas, com o objetivo de cumprir suas finalidades sociais. Ao contrário do objetivo principal das instituições financeiras tradicionais, que é a maximização do lucro, o ato cooperativo baseia-se na mutualidade, com a ausência de finalidade lucrativa entre os cooperados. Os resultados obtidos são destinados ao fortalecimento da cooperativa e redistribuídos proporcionalmente à participação de cada associado.
Esse modelo distingue-se substancialmente do sistema bancário tradicional. Nas cooperativas, os membros são simultaneamente clientes e proprietários, o que lhes dá voz nas decisões e participação nos resultados financeiros. Enquanto os bancos tradicionais focam no lucro para seus acionistas, as cooperativas se concentram em oferecer benefícios mútuos a seus cooperados, resultando em um relacionamento mais próximo, sustentável e colaborativo.
Essa estrutura cooperativa proporciona vantagens que incluem taxas de juros mais baixas e condições de crédito mais flexíveis, além de criar um ambiente de confiança mútua, em contraste com a relação mais impessoal e frequentemente conflituosa existente entre clientes e bancos tradicionais.
Situação Econômica e o Crescimento das Recuperações Judiciais no Brasil
A economia brasileira, marcada por sucessivas crises, tem forçado inúmeras empresas a recorrerem à recuperação judicial, regulamentada pela Lei nº 11.101/2005, como uma tentativa de reestruturação. Esse mecanismo busca evitar a falência, preservando empregos e atividades econômicas. Contudo, o aumento desenfreado de pedidos de RJ, muitas vezes sem uma análise criteriosa das implicações a longo prazo, tem sobrecarregado o sistema judiciário e criado barreiras ao retorno sustentável dessas empresas.
O uso inadequado da recuperação judicial pode, inclusive, engessar o CNPJ da empresa e prejudicar o CPF dos sócios, restringindo o acesso ao crédito e, em muitos casos, paralisando atividades essenciais. Esse cenário é particularmente grave no agronegócio, que exige um fluxo contínuo de crédito para sustentar a produção e manter toda a cadeia produtiva em funcionamento.
O Papel das Cooperativas de Crédito no Contexto Econômico
As cooperativas de crédito emergem como uma resposta eficaz para setores que dependem do crédito contínuo, como o agronegócio. Ao contrário dos bancos tradicionais, as cooperativas operam baseadas no ato cooperativo, oferecendo crédito em condições vantajosas e ajustadas às necessidades dos cooperados. Essa abordagem permite um relacionamento mais flexível e colaborativo, onde o cooperado participa ativamente das decisões e dos benefícios da cooperativa.
Nos maiores mercados mundiais, como França, Alemanha e Canadá, as cooperativas de crédito têm uma presença significativa no sistema financeiro. Na França, por exemplo, as cooperativas representam cerca de 60% do mercado bancário de varejo. Na Alemanha, esse percentual gira em torno de 15%, e em Quebec, no Canadá, as cooperativas de crédito dominam aproximadamente 40% do setor bancário.
Em comparação, o Brasil ainda tem um caminho a percorrer. Embora as cooperativas de crédito estejam crescendo, especialmente no agronegócio, sua participação no mercado financeiro brasileiro ainda é modesta quando comparada aos países mencionados. O fortalecimento do sistema cooperativo no Brasil, especialmente nas áreas rurais, pode desempenhar um papel fundamental no desenvolvimento econômico e na inclusão financeira.
Desafios e Perspectivas
Diante desse cenário, é crucial que empresários e produtores rurais compreendam plenamente as implicações da recuperação judicial antes de adotá-la como solução. Muitos escritórios jurídicos têm promovido a RJ como uma solução rápida para problemas financeiros, sem esclarecer todas as suas consequências a longo prazo, como as restrições de crédito e os impactos no CPF dos sócios. Sem o devido cuidado, essas decisões podem comprometer a sustentabilidade da empresa e de sua operação.
Por outro lado, o fortalecimento das cooperativas de crédito e a promoção do ato cooperativo oferecem um caminho mais seguro e sustentável para a manutenção das atividades produtivas. A cooperação, ao invés da competição, pode ser a chave para garantir a continuidade do setor produtivo brasileiro, especialmente no agronegócio.
Conclusão
A recuperação judicial e o ato cooperativo oferecem soluções distintas para crises financeiras no Brasil. Enquanto a recuperação judicial, mal aplicada, pode ter consequências devastadoras para empresas e seus sócios, as cooperativas de crédito, com sua estrutura baseada no ato cooperativo, proporcionam uma alternativa mais sustentável e ajustada às necessidades dos produtores e empresários. Em estados como Mato Grosso do Sul, onde o agronegócio é a base da economia, o fortalecimento das cooperativas é essencial para garantir o fluxo de crédito e a continuidade das atividades produtivas, assegurando um futuro mais estável para o setor e para a economia nacional.