Campo Grande, 11 de julho de 2024
Descriminalizar porte e quantidade de drogas: invasão de competência?
Por: José Carlos Manhabusco
Tivemos o privilégio de advogar na área criminal pelo período de 10 (dez) anos. Para melhor análise do tema vamos trazer um pouco da evolução da legislação.
O problema dos tóxicos foi tratado pela primeira vez na legislação brasileira pelo Decreto 4.294, de 6 de julho de 1921. Surgiram posteriormente outras leis: Decreto 20.030, de 11.1.1932; Decreto 24.505, de 26.6.1934; Decreto-lei 891, de 25.11.1938; Código Penal de 1940, título VIII, capítulo III; Decreto3.114, de 13.3.1942; Decreto-lei 4.720, de 21.9.1942; Decreto-lei 8.646, de 11.1.1946; Decreto 20.297, de 14.1.1946; Decreto-lei 159, de 1.2.1968; Decreto-lei 385, de 26.12.1968; Decreto-lei 573, de 11.8.1969; Decreto-lei 385, de 26.12.1968; Decreto-lei 573, de 11.8.1969; Lei 5.726, de 29.10.1971; Decreto 69.845, de 27.12.1971; Lei 6.368, de 21.10.1976 e Decreto 78.992, de 21.12.1976.
Foram ratificadas a Convenção de Haia (Decreto 11.481, de 1915), a Convenção de Genebra de 1925 (Decreto 22.950, de 1933), a Convenção de Genebra de 1933 (Decreto 2.944, de 1938), a Convenção única de New York sobre Entorpecentes (Decreto 54.216, de 1964) e a Convenção de Viena, de 1971 (Decreto 79.388, de 1977).
A Lei 5.726, de 1971, dispunha sobre medidas preventivas e repressivas ao tráfico e uso de substâncias entorpecentes ou que determinassem dependência física ou psíquica, dando outras providências. Essa lei distinguiu ainda mais que na legislação anterior as figuras do traficante e do viciado. Era bastante abrangente, mas apresentava deficiências, sobretudo no tocante ao processo. O rito era sumeríssimo: a lei fora feita para um processo de rapidez impraticável nos moldes atuais do sistema judiciário brasileiro. O réu era apresentado ao juiz e a denúncia feita oralmente pelo promotor; a seguir o réu era interrogado e apresentavam-se as testemunhas. Em vista do grande número de casos a julgar em cada uma das varas criminais, essa lei acabou tornando-se inoperante.
O estatuto, de número 6.368, chamado “lei antitóxico”, era tecnicamente mais aperfeiçoado. Ele dispunha sobre medidas de prevenção e repressão ao tráfico ilícito e uso indevido de substâncias entorpecentes ou que determinem dependência física ou psíquica, e dava outras providências (Enciclopédia Barsa – Serviços e Pesquisas – Título do artigo: A toxicomania em face da lei brasileira – número 390)
Gostaríamos de ressalvar as doutrinas de Damásio E. de Jesus, Vicente Greco Filho, Celso Delmanto, Pedro Mudreg Basan, Donaldo J. Felippe, dentre outros.
Agora estamos sob o pálio da Lei 11.343/2006.
A questão nodal diz respeito a competência e atribuição dos Poderes.
Tese de repercussão geral foi fixada na sessão de quarta-feira (26.6), assim como critérios que devem diferenciar usuário de traficante.
Segundo informações extraídas do site do STF, o Plenário do Supremo Tribunal Federal formou maioria na terça-feira (25.6) para descriminalizar o porte de maconha para consumo pessoal. O julgamento já foi concluído com a fixação da tese do limite do porte de 40 (quarenta) gramas que deve diferenciar usuário de traficante.
Conforme a maioria dos votos, o porte deve ser caracterizado como ilícito de natureza administrativa, sem consequências penais. Assim, após o fim do julgamento, poderá ficar afastado, por exemplo, o registro na ficha criminal do usuário.
Os ministros também chegaram ao consenso sobre a liberação de valores contingenciados do Fundo Nacional Antidrogas e a destinação de parte da verba em campanhas educativas, sobretudo para os mais jovens, sobre malefícios do consumo de drogas, de forma semelhante ao que é feito em campanhas sobre cigarro.
Ao fim da sessão, o presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, frisou que o Plenário mantém a visão de que o consumo de drogas é algo ruim e que o papel do Estado é combater o tráfico e auxiliar os dependentes. “Em nenhum momento, estamos legalizando ou dizendo que o consumo de drogas é algo positivo. Pelo contrário. Estamos apenas deliberando a melhor forma de enfrentar essa epidemia que existe no Brasil”, afirmou. “As estratégias que temos adotado não têm funcionado porque o consumo só faz aumentar, e o poder do tráfico também”.
Barroso fez questão de frisar que a maconha continua a ser uma substância ilícita e não pode ser consumida em lugar público.
A discussão é sobre a constitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006), que prevê sanções alternativas – como medidas educativas, advertência e prestação de serviços – para quem compra, porta, transporta ou guarda drogas para consumo pessoal.
Também com informações obtidas na página da Câmara dos deputados, em ato contínuo, o presidente da Câmara dos Deputados, Artur Lira (PP-AL), determinou a criação de uma comissão especial para discutir a Proposta de Emenda à Constituição 45/23, que criminaliza a posse e o porte de qualquer quantidade de droga.
O ato da Presidência foi publicado no Diário da Câmara dos Deputados na terça-feira (25.6), mesmo dia em que a maioria do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu descriminalizar o porte de maconha para uso pessoal.
A PEC 45/23 é oriunda do Senado e já teve sua admissibilidade aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara em 12 de junho. A comissão especial será composta por 34 membros titulares e igual número de suplentes, indicados pelos partidos.
A Mesa Altera o art. 5º da Constituição Federal, para prever como mandado de criminalização a posse e o porte de entorpecentes e drogas afins sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, observada a distinção entre traficante e usuário. Art. 1º O caput do art. 5º da Constituição Federal passa a vigorar acrescido do seguinte inciso LXXX: “Art. 5º …………………………
Com informações extraídas da página do Senado Federal, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), disse na terça-feira (25.6) que discorda da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) a favor da descriminalização do porte de maconha para uso pessoal. Para ele, a decisão invade a competência técnica da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a competência legislativa do Congresso Nacional sobre o tema, além de gerar uma lacuna jurídica no Brasil.
“Ou seja, a substância entorpecente na mão de quem a tem para fazer o consumo é um insignificante jurídico sem nenhuma consequência a partir dessa decisão do STF. E essa mesma quantidade dessa mesma substância entorpecente na mão de alguém que vai repassar a um terceiro é um crime hediondo de tráfico ilícito de entorpecentes. Há uma discrepância nisso”, avalia Pacheco.
Segundo Pacheco, apesar de pregar o respeito às decisões judiciais, a descriminalização só pode se dar pelo processo legislativo e não por uma decisão judicial.
“Essa questão da descriminalização das drogas é uma ideia suscitada em várias partes do mundo, mas há um caminho próprio para se percorrer nessa discussão, que é o processo legislativo”, disse, lembrando que há critérios técnicos para definir se uma substância é considerada ilícita ou não.
A respeito do debate no Supremo Tribunal Federal sobre a descriminalização do porte de maconha para uso pessoal, Pacheco disse que a decisão deve ser respeitada, e que eventual discordância deve ser contestada por meio de recurso ou de leis a serem votadas no Congresso Nacional e sem hostilidades a decisões judiciais. O presidente do Senado reiterou que discorda da decisão do STF, e que uma descriminalização só pode se dar pelo processo legislativo, e não por uma decisão judicial.
— Há um critério técnico para se dizer se uma substância deve ser considerada um entorpecente ilícito ou não, e há um rol nesse sentido estipulado pela administração pública através da Anvisa. O Senado fez sua parte em relação a isso. Foi apresentada uma proposta de emenda à Constituição que absolutamente não inova, ela busca disciplinar a política antidrogas no Brasil da forma como está, sem a ruptura de uma descriminalização a partir de uma decisão judicial. A PEC diz que a lei considerará crime o porte de substância ilícita de entorpecente. A consequência de quem porta para consumo uma substância ilícita [definida pela Anvisa, e não pelo Congresso Nacional ou Poder Judiciário] não pode ser prisão, não pode prender usuário. Mas é preciso ter uma consequência jurídica, porque aquela mesma substância, momentos antes, estava na mão de alguém que pratica um crime hediondo [de tráfico ilícito de entorpecente].
Pacheco ressaltou ainda que “quando se tem uma decisão que descriminaliza uma parte sem descriminalizar a outra, você acaba punindo severamente alguém que repassou, e aquele que detém a mesma substância entorpecente não tem consequência jurídica alguma, porque há uma lacuna legislativa em relação a isso”.
— Não é uma discussão sobre se a maconha faz mal ou não, se deve ser legalizada ou não, essa discussão até pode existir mesmo e é bom que haja essa discussão, eu vou ter até a minha opinião em relação a ela, mas é uma discussão de método e de forma. Quando se descriminaliza uma conduta que é típica e criminalizada pelo Poder Legislativo, e isso se dá por uma decisão judicial, isso gera realmente uma distorção grande no ordenamento jurídico e no próprio combate a esse tipo de crime no Brasil. Ainda que se descriminalize a conduta de quem porta para consumo, a lógica é: aquele que porta para consumo necessariamente, no Brasil, adquiriu de um traficante, que comete crime hediondo porque não há local para comprar. Isso é um defeito que nós vamos ter que corrigir em algum momento — esclareceu.
Não nos parece uma questão tão simples de solucionar, pois envolve inúmeros fatores quanto a comercialização, distribuição, quantidade, fiscalização etc., além das questões sociais e culturais.
Também não há certeza quanto a diminuição da densidade carcerária.
Com efeito, os Poderes devem ser independentes e harmônicos, ou seja, cada um com a vossa competência. É o que diz a Constituição da República Federativa do Brasil.
Entendemos que o Supremo Tribunal Federal tem a função de controlar a constitucionalidade da interpretação da lei, bem como fixar a respectiva modulação (norma constitucional) e o Congresso Nacional (Senado e Câmara) de legislar.
O DEBATE ESTÁ POSTO. COM A PALAVRA OS NOBRES JURISTAS!
Fontes: Agência Câmara de Notícias – Senado Federal – Agência Brasil – STF.