STJ rejeita suspeição de juíza para rejulgar ação após causar nulidade e condenar o réu

As causas de suspeição do juiz estão previstas no artigo 252 do Código de Processo Penal e não podem ser interpretadas para além do texto literal da lei. Assim, tal suspeição não pode ser presumida. Em vez disso, deve ser cabalmente comprovada.
Com esse entendimento, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça rejeitou a suspeição de uma juíza cujo comportamento causou a nulidade da instrução de uma ação penal em que ela chegou a condenar o réu.

A instrução foi anulada pela primeira vez pelo próprio STJ porque a magistrada assumiu protagonismo na produção da prova: conduziu o interrogatório, com interesse desproporcional e ofuscando a atuação até do Ministério Público, responsável pela acusação.

A conclusão da juíza foi pela condenação do réu. Com a anulação da instrução, a defesa apontou que a magistrada não teria imparcialidade para refazer os atos.

Por 3 votos a 1, a 6ª Turma entendeu que não há prova cabal da suspeição da juíza. Com isso, ela poderá permanecer na condução do processo, inclusive para proferir uma nova sentença.

Sem generalizar

Venceu a posição do relator, ministro Sebastião Reis Júnior. Nesta terça-feira (20/2), ele explicou que o STJ não pode generalizar uma posição sobre a suspeição do juiz quando a nulidade da instrução for causada por alguma conduta sua.

A análise vai depender de cada caso. Votaram com ele o ministro Antonio Saldanha Palheiro e o desembargador convocado Jesuíno Rissato.

Abriu a divergência e ficou vencido o ministro Rogerio Schietti, para quem o comportamento da juíza na instrução do processo coloca em dúvida sua imparcialidade para seguir na condução e sentença da ação penal.

Seu voto propôs que a instrução probatória não fosse anulada pela segunda vez. Caberia ao novo juiz designado analisar os autos e concluir quais atos praticados pela magistrada suspeita poderiam ou não ser aproveitados.

Protagonismo contido

O protagonismo do juiz na produção da prova é mesmo uma conduta rechaçada pela jurisprudência do STJ, especialmente após a edição da Lei Anticrime (Lei 13.964/2019), que consagrou a estrutura acusatória — e não inquisitória — do processo penal brasileiro.

A divergência na 6ª Turma foi causada pelas nuances do caso concreto. Todos os ministros concordam que, ao conduzir a ação penal, o juiz deve ter cautela, mas pode praticar atos com o interesse de conhecer os fatos e aplicar a lei.

Para Schietti, o comportamento de extremo interesse durante a primeira instrução probatória foi o que tirou da magistrada a imparcialidade. “E sem nenhum interesse. Foi apenas uma maneira possivelmente enviesada de se conduzir uma causa”, destacou.

Para a maioria, a falta de indicação de que havia esse interesse pessoal na condenação do réu é o que torna possível afastar a suspeição.

“A gente não pode esquecer que prova é produzida para o juiz. Vejo com muita relevância e pertinência o juiz aprofundar determinada questões que podem estar trazendo ou não convencimento para decidir. A suspeição é preciso demonstrar de uma forma bastante densa”, disse o ministro Saldanha Palheiro.

“Para a suspeição, a parte deve provar que a juíza teria interesse subjetivo no deslinde da causa. No caso, à primeira vista, não parece que existia algum interesse particular em decidir dessa ou daquela maneira”, disse o desembargador convocado Jesuíno Rissato.

HC 763.021

Fonte: Consultor Jurídico

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