O direito ao silêncio e a não autoincriminação

Campo Grande, 03 de julho de 2024
Uma análise do artigo 186 do código de processo penal brasileiro à luz do princípio nemo tenetur se degere

João Pedro da Silva Fialho1

Ricardo Souza Pereira2

Heitor Romero Marques3

RESUMO: O presente artigo utilizou da revisão bibliográfica para coleta de dados e fundamentação teórica, fazendo uso de uma tendência hipotético-dedutiva e tomando por procedimento a lógica analíticosintética. Tem como objetivo analisar o Artigo 186 do Código de Processo Penal e sua relação com o direito ao silêncio e a não autoincriminação, identificando as principais características do princípio nemo tenetur se detegere e sua aplicação no ordenamento jurídico, observando as possibilidades e limites do sistema jurídico em relação à produção de provas e ao exercício da ampla defesa no processo penal, verificando a jurisprudência nacional em relação à aplicação do Artigo 186 do Código de Processo Penal e sua interpretação em casos concretos, pois o direito ao silêncio, é previsto no artigo 5º, LXIII, da Constituição Federal, permite ao acusado permanecer em silêncio durante o interrogatório, sem que isso seja interpretado em seu prejuízo e o princípio da não autoincriminação, ou nemo tenetur se detegere, é uma garantia de ordem internacional que visa proteger o indivíduo de se autoincriminar, ou seja, de produzir provas contra si mesmo, porém mesmo com a atualização da antiga redação do artigo 186 do Código de Processo Penal: O silêncio poderá ser interpretado em prejuízo da própria defesa; alterada em sua Lei 10.792/2003, ainda é muito subjetivo a interpretação deste artigo. Esta garantia constitucional para a maioria dos juristas e tribunais brasileiros caracteriza o silêncio como desfavorável ao réu, deixando de seguir a própria legislação. Por fim, busca-se analisar o artigo 186 do Código de Processo Penal brasileiro lida com essa questão, seja ela em audiências ou em plenário, no tribunal do júri, e assim, compreender a abrangência e a importância desse direito fundamental para a garantia da justiça e dos direitos individuais.

PALAVRAS-CHAVE: Direito ao silêncio – Nemo tenetur se detegere – Presunção de inocência – Não autoincriminação – Direito fundamental.

ABSTRACT: This article used bibliographic review for data collection and theoretical foundation, employing a hypothetical-deductive approach and applying analytic-synthetic logic. Its objective is to analyze Article 186 of the Code of Criminal Procedure and its relation to the right to silence and non-self-incrimination, identifying the main characteristics of the “Nemo tenetur se detegere” principle and its application in the legal system. It observes the possibilities and limits of the legal system regarding evidence production and the exercise of the right to a full defense in criminal proceedings, examining national jurisprudence regarding the application of Article 186 of the Code of Criminal Procedure and its interpretation in specific cases. The right to silence, provided for in Article 5, LXIII, of the Federal Constitution, allows the accused to remain silent during interrogation without it being interpreted to their detriment. The principle of non-self-incrimination, or nemo tenetur se detegere, is an internationally recognized safeguard that aims to protect individuals from self- incrimination, that is, from producing evidence against themselves. However, even with the update of the previous wording of Article 186 of the Code of Criminal Procedure – “Silence may be interpreted to the detriment of one’s own defense” – amended by Law 10.792/2003, the interpretation of this article remains highly subjective. This constitutional guarantee is deemed unfavorable to the defendant by most Brazilian jurists and courts, disregarding the legislation itself. Finally, this study seeks to analyze how Article 186 of the Brazilian Code of Criminal Procedure deals with this issue and, thus, understand the scope and importance of this fundamental right for ensuring justice and individual rights. 

KEYWORDS: Right to silence – Nemo tenetur se detegere – Presumption of innocense- Non-self- incrimination – Fundamental right.

 

1  INTRODUÇÃO

O processo penal é um ramo do direito que tem por objetivo regular a aplicação do direito penal, ou seja, a punição de condutas consideradas ilícitas pelo Estado. É preciso observar que a proteção dos direitos fundamentais do acusado é um elemento essencial desse ramo, especialmente quando se trata do direito ao silêncio e da não autoincriminação.

A interpretação desempenha um papel crucial no mundo jurídico, é através dela que as leis e normas são aplicadas aos casos concretos. A interpretação adequada é essencial para garantir a justiça e a imparcialidade nos julgamentos, um equívoco na interpretação pode levar a decisões injustas e prejudiciais aos envolvidos. O sistema jurídico é composto por um conjunto de leis e princípios que estabelecem direitos e deveres, mas muitas vezes essas normas podem ser vagas, ambíguas ou até mesmo contraditórias. É responsabilidade dos operadores do direito, como advogado, juízes, promotores, dentre outros, interpretar e aplicar as leis de maneira correta e coerente. Uma interpretação inadequada pode levar a consequências graves, como a condenação de um inocente ou a absolvição de um culpado.

Uma interpretação equivocada desses princípios pode levar a violações dos direitos individuais e à injustiça, a interpretação desempenha um papel fundamental na evolução e adaptação do direito às mudanças sociais, culturais e tecnológicas. À medida que a sociedade avança, novos desafios e questões surgem, e é através da interpretação das leis existentes que se busca encontrar respostas adequadas e atualizadas para essas demandas.

Decisões judiciais equivocadas podem comprometer a credibilidade e a confiança no sistema de justiça como um todo. Por essa razão, a interpretação correta das leis é essencial para garantir a efetividade e a legitimidade do sistema jurídico. No campo penal a interpretação adequada das leis é fundamental para resguardar os direitos fundamentais dos acusados, como o direito ao silêncio, o direito à ampla defesa e o princípio da presunção de inocência.

Diante disso, este trabalho se propõe a analisar o artigo 186 do Código de Processo Penal à luz do princípio nemo tenetur se detegere, que assegura ao acusado o direito de não se autoincriminar e permanecer em silêncio durante o processo penal, visto que, a aplicação dessas garantias no processo penal brasileiro ainda é controversa. Para tanto, será feita uma análise detalhada da legislação  brasileira e da jurisprudência sobre o tema,  buscando-se compreender as principais discussões e desafios envolvidos nessa questão. Esta pesquisa está vinculada à Linha de Pesquisa “Direito, Constituição e Sociedade”, que se propõe a analisar as questões jurídicas mais relevantes no âmbito do direito constitucional e do direito processual, buscando-se compreender a relação entre o direito e a sociedade. A subárea de pesquisa específica deste trabalho é o direito processual penal, com enfoque na proteção dos direitos fundamentais do acusado.

Analisando principalmente como é realizada a prática do direito ao silêncio, tanto em audiência, quanto no tribunal do júri, visto que, ambas possuem interpretações dessemelhantes, pois, em audiência quem irá julgar e dar a sentença ao caso é o juiz, já no tribunal do júri a interpretação do caso é formulado em plenário em apenas um dia pelos sete jurados sorteados para composição do júri.

Em suma, esta pesquisa busca contribuir para a discussão sobre a proteção dos direitos fundamentais no processo penal brasileiro, em especial no que se refere ao direito ao silêncio e a não autoincriminação, e sua relação com o princípio nemo tenetur se detegere. Afinal, precisamos garantir que o acusado não seja forçado a produzir provas contra si mesmo, uma vez que isso seria uma clara violação do seu direito à ampla defesa e ao devido processo legal.

2   O DIREITO AO SILÊNCIO: RAÍZES HISTÓRICAS, PROTEÇÃO, DILEMAS E MUDANÇAS DE PARADIGMA

O direito ao silêncio tem raízes antigas na noção de presunção de inocência, ao longo da história e em diferentes contextos sociais, diversas sociedades reconheciam a importância de proteger os indivíduos acusados de crimes, presumindo-os inocentes até que sua culpa fosse comprovada de forma convincente.

Ao longo dos séculos, esse princípio evoluiu e se consolidou como um dos fundamentos do sistema jurídico moderno. O direito ao silêncio é uma das manifestações tangíveis desse princípio, concedendo aos acusados o poder de se protegerem e evitarem a autoincriminação.

No princípio do nemo tenetur se detegere (ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo). Essa concepção remonta ao direito romano, com destaque para a figura do ius tacendi “direito de se calar” (BOTTINO, 2009)

O ius tacendi é um termo latino que se refere ao direito ao silêncio, ou seja, o direito de uma pessoa de permanecer calada e não responder a perguntas durante um interrogatório ou processo judicial. Esse conceito está diretamente relacionado à garantia constitucional do direito de não produzir provas contra si mesmo. Ius tacendi pode ser entendido como o direito inalienável de uma pessoa se recusar a responder perguntas ou fornecer informações que possam incriminá-la. É uma prerrogativa fundamental que visa proteger a dignidade e os direitos do acusado (LUPÁRIA, 2006)

Durante a Idade Média e o período da Inquisição, o direito ao silêncio era frequentemente ignorado, e a tortura era usada para obter confissões. Algumas influências jurídicas e doutrinárias defendiam a necessidade de respeitar o direito de um acusado de permanecer em silêncio (ASSIS, 2022)

Não obstante do tema desta monografia, precisamos falar sobre a tortura, e a escravidão. Por que falar brevemente destes dois temas que nada parecem se assemelhar com o tema do direito ao silêncio?

Pois bem, no século XII era legalmente aceito que escravos em casos criminais ou até mesmo em processos cíveis, poderiam ser torturados com a finalidade de obter confissão ou mero testemunho com credibilidade, visto que, apenas a fala do escravo (que não era considerado cidadão) não passava confiança suficiente, logo eram torturados para que as provas produzidas através de seus testemunhos pudessem ter efeitos (EINOLF, 2007).

Como podemos observar neste trecho do livro Fall and Rise of Torture: A Comparative and Historical Analysis (Queda e Ascensão da Tortura: Uma Análise Comparativa e Histórica):

“Os escravos não só podiam ser torturados em casos criminais, mas também quando serviam como testemunhas em processos civis entre homens livres. Normalmente, os escravos não tinham permissão para testemunhar nesses processos, pois não eram cidadãos, mas o uso da tortura era pensado para dar credibilidade ao testemunho do escravo e tornava seu testemunho admissível. Pouca importância ou objeção moral parece ter sido dada à dor física sofrida pelo escravo” (EINOLF, 2007, p. 107)

Ao longo dos séculos, com o desenvolvimento do Estado de Direito e a evolução dos sistemas jurídicos, o direito ao silêncio foi ganhando reconhecimento e proteção mais ampla. Porém no século XII a tortura era usada com frequência entre os cidadãos, sempre para auxiliar na produção de provas. Em outro trecho do livro supramencionado, podemos observar que os juízes as vezes autorizavam a tortura para forçar uma “suposta confissão”.

“A partir do século 12, a tortura passou a ser usada com mais frequência em cidadãos. Tanto para crimes comuns como para crimes especiais de heresia e prova circunstancial que indicassem culpa, mas sem testemunhas oculares ou apenas uma testemunha ocular, os juízes não conseguiam chegar a uma conclusão de culpa se o acusado afirmasse sua inocência. Nesses casos, os juízes às vezes autorizavam a tortura para forçar uma confissão. Na Europa medieval, como em períodos históricos anteriores, um cidadão acusado de um delito criminal só poderia ser torturado se outras evidências tornassem provável sua culpa” (EINOLF, 2007, p. 107)

Neste contexto histórico, mesmo os juízes não respeitavam o direito ao silêncio do réu. Ao confrontarem a negação da acusação e a manutenção da inocência por parte do acusado, os juízes recorriam à tortura como meio de obter uma confissão, revelando uma falta de consideração pelo direito fundamental do indivíduo de não produzir provas contra si mesmo.

Essa atitude dos juízes da época reflete uma compreensão distorcida da justiça, em que a obtenção de uma confissão, muitas vezes por meio da tortura, era considerada mais importante do que a garantia dos direitos individuais do acusado. O silêncio do réu não era respeitado, e a tortura era vista como uma ferramenta legítima para alcançar a verdade dos fatos, mesmo que à custa do sofrimento físico e moral do acusado. Essa realidade histórica serve como um lembrete impactante do progresso alcançado na proteção dos direitos humanos e na valorização do direito ao silêncio.

Atualmente, embora tenhamos avançado em reconhecer o direito ao silêncio como uma salvaguarda fundamental para evitar a coerção e a violação da dignidade humana, ainda existem vestígios de costumes e percepções antigas que desvalorizam o silêncio do acusado. O ditado popular “quem cala consente” reflete uma mentalidade arraigada na sociedade, onde o silêncio é frequentemente interpretado como uma forma de concordância ou admissão de culpa (CARVALHO, 2022).

Essa mentalidade pode se estender até mesmo aos magistrados, que podem, em alguns casos, interpretar o silêncio do acusado em prejuízo de sua defesa, apesar da garantia legal de que o silêncio não deve ser interpretado desta forma. Embora o direito ao silêncio seja consagrado e protegido no sistema jurídico moderno, esses resquícios de costumes e percepções equivocadas destacam a importância contínua de educar e conscientizar a sociedade sobre a verdadeira natureza do silêncio como um direito fundamental do acusado (CARVALHO, 2022)

É fundamental que possamos compreender que o direito ao silêncio é um elemento essencial da presunção de inocência seja disseminada e reforçada, tanto entre os cidadãos em geral quanto entre os próprios magistrados. Somente assim poderemos garantir que o processo penal seja conduzido de forma justa, equilibrada e respeitosa aos direitos fundamentais de todos os envolvidos, reconhecendo plenamente a importância e o valor do direito ao silêncio do réu.

Ao longo dos séculos, o direito ao silêncio foi muitas vezes negligenciado e desconsiderado, apesar de ser um direito fundamental para o acusado. Os costumes arraigados e as percepções dominantes minimizaram sua importância. Especialmente na Idade Média, o uso frequente da tortura revela como o silêncio do acusado era desconsiderado em busca de confissões forçadas. Embora tenham ocorrido avanços significativos com o estabelecimento do Estado de Direito e a evolução dos sistemas jurídicos, vestígios desses costumes ainda persistem, refletindo-se até mesmo em ditados populares (EINOLF, 2007)

É notável que muitos tendem a interpretar o silêncio do acusado como um sinal de culpa ou de falta de cooperação. Essa interpretação errônea vai de encontro à garantia legal de que o silêncio não deve ser interpretado em prejuízo da defesa. Nesse contexto, o direito ao silêncio se tornava um dilema para o acusado, pois negar a acusação e manter sua inocência poderia resultar na autorização da tortura como meio de obtenção de uma confissão (BECHARA, 2017)

A compreensão distorcida da justiça na Idade Média, onde a obtenção de confissões era mais valorizada do que o respeito aos direitos individuais, levou à violação do direito ao silêncio e à utilização da tortura como meio de obter uma “suposta confissão”. Essa realidade histórica nos faz refletir sobre o progresso alcançado na proteção dos direitos humanos e no reconhecimento do direito ao silêncio.

É crucial continuar promovendo a compreensão e conscientização sobre o verdadeiro significado e a importância do direito ao silêncio. Devemos superar os preconceitos arraigados e reafirmar o direito do acusado de permanecer em silêncio sem sofrer consequências negativas. Somente assim poderemos garantir um sistema de justiça equitativo, respeitando plenamente os direitos fundamentais de todos os envolvidos no processo penal.

Ao garantir que o acusado não seja obrigado a produzir provas contra si mesmo, o direito ao silêncio permite que ele faça uma escolha informada sobre como responder às acusações, mesmo quando outras evidências possam parecer incriminatórias. Por conseguinte, é essencial reconhecer e valorizar plenamente o direito ao silêncio, disseminando seu verdadeiro significado e sua importância na sociedade. Ao fazer isso, fortaleceremos a justiça, garantindo um tratamento equitativo a todos os indivíduos envolvidos no processo penal e protegendo os direitos fundamentais de cada um.

3      O DIREITO AO SILÊNCIO E A PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA COMO GARANTIAS INDISPENSÁVEIS PARA UMA SOCIEDADE JUSTA E EQUITATIVA

O direito ao silêncio é amplamente reconhecido como um componente essencial do devido processo legal e do respeito aos direitos humanos. Ele assegura ao acusado o direito de não se incriminar, preservando sua dignidade e a garantia de um julgamento justo. A evolução do direito ao silêncio ao longo da história reflete a busca por um sistema de justiça mais equitativo e respeitoso aos direitos individuais, afastando-se das práticas coercitivas e desumanas que marcaram o passado (BOTTINO, 2009)

Como a tortura hoje não é mais usada em nenhuma oportunidade, tanto a física quanto a psicológica, é claro a mudança que enfrentamos dia após dia, com a finalidade de evoluirmos para uma sociedade cada vez mais justa e moderna.

Frisamos que aquilo que é considerado justo no presente pode, em um futuro próximo, revelar-se uma injustiça para o coletivo. Devemos estar atentos à evolução dos conceitos e valores sociais, buscando constantemente aprimorar e adaptar nossas noções de justiça, a fim de garantir a igualdade, a equidade e o respeito aos direitos de todos os indivíduos, como já dizia Norberto Bobbio, os direitos do homem são históricos:

“Do ponto de vista teórico, sempre defendi — e continuo a defender, fortalecido por novos argumentos — que os direitos do homem, por mais fundamentais que sejam, são direitos históricos, ou seja, nascidos em certas circunstâncias, caracterizadas por lutas em defesa de novas liberdades contra velhos poderes, e nascidos de modo gradual, não todos de uma vez e nem de uma vez por todas” (A era dos direitos / Norberto Bobbio; tradução Carlos Nelson Coutinho; apresentação de Celso Lafer. — Nova ed. — Rio de Janeiro: Elsevier, 2004. — 7ª Reimpressão).

Não é de hoje que evidenciamos leis complexas, que garantem os direitos dos homens, porém, não é novidade que no decorrer da prática jurídica podemos observar alterações incrementadas pelos homens, a fim de obter um resultado mais favorável para a sociedade em um todo ou ao menos em sua maioria.

Observamos que os seres humanos, incluindo os nobres magistrados, legisladores, defensores, promotores, juízes e outros, desempenham um papel fundamental na aplicação das normas legais, priorizando o cumprimento dos direitos estabelecidos, mesmo que nem sempre resultem na tão almejada “justiça”. Eles se esforçam para garantir que o devido processo legal seja seguido e que o direito seja exercido, reconhecendo que essa abordagem é um meio de alcançar um sistema jurídico mais justo e equitativo (LLOYD, 2017)

Objetivando cada vez mais está justiça para que possa ser alcança através do processo de garantir todos os direitos fundamentais para que aí sim possamos alcançar a justiça. O artigo 5º, inciso LXIII, da Constituição Federal brasileira estabelece um importante direito no âmbito do processo penal: LXIII – o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado; essa garantia, de permanecer em silêncio, tem como objetivo proteger o indivíduo contra a autoincriminação forçada, assegurando-lhe a liberdade de decidir se irá falar ou não durante os procedimentos judiciais.

O direito ao silêncio, é um princípio fundamental no sistema penal democrático. Ele visa evitar que o acusado seja compelido a produzir provas contra si mesmo, resguardando a dignidade e a liberdade individual. Esse direito está intrinsecamente ligado ao princípio do nemo tenetur se detegere (ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo) (LOPES JR., 2019)

Esse princípio está fundamentado em garantias constitucionais e tratados internacionais, que visam proteger a liberdade individual e a dignidade do acusado durante o processo penal. Segundo o artigo 5º, inciso LXIII da Constituição Federal brasileira, o preso tem o direito de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado. Além disso, o Pacto de San José da Costa Rica, em seu artigo 8º, letra g, estabelece o direito de não ser obrigado a depor contra si mesmo, nem a declarar-se culpado.

O princípio Nemo tenetur se detegere abrange não apenas o direito ao silêncio, mas também engloba o direito de não ceder seu corpo, partes do corpo ou substâncias corporais para a produção de prova. O acusado não possui qualquer obrigação de colaborar com a produção de provas que possam prejudicá-lo, assim como a acusação não tem a obrigação de cooperar com a defesa (CARVALHO, 2022)

Um autor que discute e conceitua esse princípio é Flávio Meirelles Medeiros. Ele aborda em suas obras a importância do direito ao silêncio e da não autoincriminação como garantias fundamentais no processo penal. Em sua obra Direito Processual Penal, Meirelles apresenta uma análise aprofundada dos institutos do direito processual penal, incluindo o princípio do direito ao silêncio e da não autoincriminação, oferecendo subsídios teóricos para compreender a importância e os fundamentos desse princípio no contexto do sistema penal brasileiro (MEIRELLES, 2020)

Quando o preso é informado sobre seus direitos, incluindo o direito ao silêncio, ele tem a possibilidade de decidir se irá exercê-lo ou não, em tese. Caso opte por permanecer em silêncio, sua decisão não poderá ser utilizada de forma negativa contra ele no decorrer do processo. Em outras palavras, o silêncio não pode ser interpretado como um indício de culpa (TÁVORA; PACHECO FILHO, 2012)

Um exemplo prático do exercício do direito ao silêncio ocorre durante um interrogatório policial ou judicial. O acusado pode escolher não responder às perguntas formuladas, alegando seu direito ao silêncio. Nesse caso, é dever das autoridades respeitar essa decisão e não utilizar o silêncio como um fator para presumir a culpa do indivíduo. O direito ao silêncio busca equilibrar o poder do Estado na busca pela verdade com a necessidade de proteger os direitos e a dignidade do acusado.

Em suma, o artigo 5º, inciso LXIII, da Constituição Federal é um importante dispositivo legal que consagra o direito ao silêncio do preso. Ele desempenha um papel fundamental na proteção dos direitos fundamentais no âmbito do processo penal, garantindo que o acusado não seja compelido a produzir provas contra si mesmo e assegurando-lhe o direito de escolher quando e como se manifestar.

O artigo 186 do Código de Processo Penal brasileiro estabelece um direito fundamental do acusado no processo penal, esse dispositivo tem por objetivo garantir ao acusado a plena ciência de seus direitos e a liberdade de escolher se irá ou não se manifestar durante o interrogatório:

“Art. 186. Depois de devidamente qualificado e cientificado do inteiro teor da acusação, o acusado será informado pelo juiz, antes de iniciar o interrogatório, do seu direito de permanecer calado e de não responder perguntas que lhe forem formuladas. (Redação dada pela Lei nº 10.792, de 1º.12.2003)

Parágrafo único. O silêncio, que não importará em confissão, não poderá ser interpretado em prejuízo da defesa. ”

Após ser devidamente qualificado e cientificado do inteiro teor da acusação, o acusado recebe do juiz a informação sobre seu direito ao silêncio. Isso significa que ele tem a faculdade de não responder a perguntas que lhe forem dirigidas durante o interrogatório. Essa prerrogativa é assegurada como forma de proteção à ampla defesa e ao princípio da não autoincriminação.

O silêncio do acusado não pode ser interpretado em prejuízo da sua defesa. O parágrafo único do artigo 186 esclarece que o silêncio não pode ser considerado como uma confissão ou utilizado de forma negativa contra o acusado. Isso significa que o fato de o acusado optar por permanecer em silêncio durante o interrogatório não pode ser utilizado como elemento de prova para incriminá-lo (BONFIM, 2018)

Para ilustrar o funcionamento desse dispositivo, podemos imaginar a situação em que um indivíduo é acusado de um crime e está sendo interrogado em juízo. Antes do início do interrogatório, o juiz informa ao acusado sobre seu direito ao silêncio e que ele não é obrigado a responder a perguntas que lhe forem feitas. Nesse momento, o acusado tem a escolha de permanecer calado caso entenda que isso é mais favorável para sua defesa. O silêncio não pode ser interpretado como um indício de culpa ou prejudicar a sua defesa perante o tribunal (BOTTINO, 2009)

Dessa forma, o artigo 186 do Código de Processo Penal assegura ao acusado o direito de permanecer em silêncio durante o interrogatório, sem que isso seja utilizado contra ele, garantindo-lhe a ampla defesa e o respeito ao princípio da não autoincriminação.

Podemos verificar no artigo 198 do Código de Processo Penal brasileiro aborda a questão do silêncio do acusado durante o processo penal. Ele estabelece que o silêncio do acusado não será interpretado como uma confissão, ou seja, não será considerado como uma admissão de culpa. O texto destaca que o silêncio pode ser utilizado como um elemento que contribui para a formação do convencimento do juiz: Art. 198. O silêncio do acusado não importará confissão, mas poderá constituir elemento para a formação do convencimento do juiz. O fato de o silêncio do acusado poder constituir um elemento para a formação do convencimento do juiz não significa que o silêncio possa ser interpretado automaticamente como sinal de culpa. A interpretação correta desse dispositivo legal é que o silêncio pode ser levado em consideração como um elemento de prova, mas não pode ser utilizado como base única ou predominante para concluir a culpabilidade do acusado.

A presunção de inocência é um princípio fundamental do direito penal, e cabe ao Ministério Público e ao juiz apresentarem provas concretas e convincentes para comprovar a culpa do acusado. O simples fato de o acusado exercer o seu direito ao silêncio não pode ser interpretado como uma admissão de culpa ou como elemento determinante para a formação de convencimento do juiz (DI GESU, 2021). Além disso, é necessário considerar a possibilidade de outros fatores que possam explicar o silêncio do acusado, como o exercício de seu direito à ampla defesa, a orientação de seu advogado ou a possibilidade de ele se sentir intimidado ou coagido durante o processo (BIZZOTTO; SILVA, 2020)

Destacamos a importância da presunção de inocência no direito penal, ressaltando que é responsabilidade do Ministério Público e do juiz apresentarem provas concretas e convincentes para comprovar a culpa do acusado. O exercício do direito ao silêncio por parte do acusado não pode ser interpretado como uma admissão de culpa, nem pode ser usado como elemento determinante para a formação de convicção do juiz, existem diversos motivos pelos quais o acusado pode optar por permanecer em silêncio, como a proteção de seu direito à ampla defesa, a orientação de seu advogado ou a possibilidade de se sentir intimidado ou coagido durante o processo. Essa análise reforça a necessidade de uma abordagem imparcial e cautelosa ao interpretar o silêncio do acusado, levando em consideração os diversos fatores que podem influenciar sua decisão.

Para quebrar esse argumento do artigo 198, é fundamental destacar que o silêncio do acusado não pode ser interpretado isoladamente como prova de sua culpa, mas deve ser analisado em conjunto com todas as demais evidências apresentadas no processo, garantindo assim um julgamento justo e equilibrado (GLOECKNER; LOPES JR., 2017)

Um exemplo prático da aplicação desse artigo ocorre durante o julgamento de um indivíduo acusado de um crime. Durante o interrogatório ou o depoimento, o acusado opta por não responder a algumas perguntas, exercendo o seu direito ao silêncio. De acordo com o artigo 198, esse silêncio não será interpretado como uma confissão, ou seja, não poderá ser considerado como uma admissão de culpa pelos fatos imputados (NUCCI, 2022)

É necessário não ser interpretado o silêncio do acusado isoladamente como prova de sua culpa, mas sim analisá-lo em conjunto com todas as outras evidências apresentadas no processo. Isso garante um julgamento justo e equilibrado. O exemplo prático dado ilustra a aplicação do artigo 198 do Código de Processo Penal, em que um acusado escolhe não responder a certas perguntas durante o interrogatório ou depoimento, exercendo assim seu direito ao silêncio. Essa interpretação enfatiza a necessidade de considerar todas as circunstâncias e provas disponíveis antes de tirar conclusões precipitadas ou prejulgamentos com base apenas no silêncio do acusado.

Diversos juristas, como Ada Pellegrini Grinover, Antônio Magalhães Gomes Filho, Vicente Greco Filho, Júlio Fabbrini Mirabete, entre outros, destacam a importância do direito ao silêncio como parte do quadro probatório da acusação. Também há entendimentos relevantes nos tribunais superiores, como o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ), que afirmam que o acusado tem o direito ao silêncio ou à não autoincriminação, podendo se calar sobre os fatos criminosos imputados a ele, sem sofrer penalização ou valoração negativa das suas declarações.

A mera referência ao silêncio do acusado na sentença não acarreta nulidade processual, desde que haja fundamentação em outros elementos probatórios. O Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas (TJAM) também reconhece o direito ao silêncio como garantia constitucional, permitindo que o acusado permaneça em silêncio sem prejuízo à sua defesa.

O direito ao silêncio é um princípio essencial que visa proteger o acusado, garantindo a presunção de inocência e a dignidade da pessoa humana. Sua aceitação plena e a não interpretação em prejuízo da defesa são elementos fundamentais para garantir um processo penal justo e equilibrado. Nesse contexto, o renomado jurista Guilherme de Souza Nucci, em seu livro “Código de processo penal comentado”, aborda a necessidade de compreender a importância de se abstrair o silêncio do réu como elemento para sustentar uma condenação. Ele ressalta que o silêncio pode ser uma reação natural de pessoas frágeis, emocionalmente perturbadas ou que não possuem adequada assistência jurídica:

“[…] Sempre sustentamos que a necessidade de permanecer calado, muitas vezes, é uma consequência natural para pessoas frágeis. Emocionalmente perturbadas ou que não possuem a devida assistência jurídica. Não se nega que no espirito do magistrado o silêncio invocado pelo réu pode gerar a suspeita de ser de realmente o autor do crime, embora, ainda que tal se de, seja defeso ao magistrado externar o seu pensamento na sentença. Ora, como toda decisão deve ser fundamentada, o silêncio jamais deve compor o contexto de argumentos do julgador para sustentar a condenação do acusado. É preciso abstrair, por completo, o silêncio do réu, caso o exerça, porque o processo penal deve ter instrumentos suficientes para comprovar a culpa do acusado, sem a menor necessidade de se valer do próprio interessado para compor o quadro probatório da acusação […]” (NUCCI, 2022)

Segundo Nucci traz à tona a importância de abstrair o silêncio do réu como elemento para sustentar uma condenação. O autor destaca que o silêncio, muitas vezes, é uma reação natural de pessoas fragilizadas e que a decisão judicial não pode se basear exclusivamente nesse fato para inferir a culpa do acusado.

O processo penal deve ser pautado em instrumentos probatórios sólidos e independentes, capazes de comprovar a culpa ou inocência do acusado, sem a necessidade de se valer do próprio interessado. Assim, a abstração do silêncio do réu é fundamental para garantir um processo justo e equilibrado, respeitando os direitos fundamentais de todos os envolvidos no sistema de justiça.

Anteriormente, havia uma contradição no Código Penal, mais especificamente no artigo 186, que permitia a interpretação do silêncio do acusado como algo prejudicial para a própria defesa. A doutrina majoritária entendia que esse trecho do artigo 186 não era recepcionado pela Constituição de 1988, embora alguns magistrados ainda utilizassem essa interpretação.

Posteriormente, a Lei nº 10.792/2003 modificou o artigo 186, deixando claro que o silêncio do acusado não pode ser interpretado como confissão e não pode prejudicar a sua defesa. O direito ao silêncio é considerado uma manifestação da garantia da ampla defesa (NUCCI, 2022)

A necessidade de permanecer em silêncio muitas vezes é uma consequência natural para pessoas frágeis emocionalmente ou que não possuem a devida assistência jurídica. Embora o silêncio do réu possa gerar suspeita por parte do magistrado, não é permitido que ele demonstre esse pensamento na sentença, pois toda decisão deve ser fundamentada. (PAULO, 2017)

Embora o acusado tenha o direito ao silêncio, ele também pode mentir. O juiz não pode mais advertir o réu de que seu silêncio poderá ser interpretado contra ele. Cabe ao juiz informar ao acusado sobre seu direito de permanecer calado como condição necessária para o pleno exercício dessa prerrogativa constitucional. O silêncio do acusado não pode ser utilizado como elemento probatório para sustentar sua condenação, e qualquer advertência nesse sentido por parte do juiz pode levar à nulidade do ato. (CAPEZ, 2018)

O direito ao silêncio é uma garantia processual que visa equilibrar o poder estatal e proteger os direitos individuais do acusado. O respeito a esse direito é essencial para garantir um processo penal justo e respeitoso aos princípios constitucionais.

O princípio do Nemo tenetur se detegere abrange não apenas o direito ao silêncio, mas também engloba o direito de não ceder seu corpo, partes do corpo ou substâncias corporais para a produção de prova. O acusado não possui qualquer obrigação de colaborar com a produção de provas que possam prejudicá-lo, assim como a acusação não tem a obrigação de cooperar com a defesa.

É presente no nosso ordenamento jurídico o direito ao silêncio não apenas em seu artigo 186 do Código de Processo Penal, mas está previsto também no artigo 5º, inciso LXIII, da Constituição Federal brasileira, que estabelece que o preso tem o direito de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado. Não obstante, o Pacto de San José da Costa Rica, em seu artigo 8º, letra g, estabelece o direito de não ser obrigado a depor contra si mesmo, nem a declarar-se culpado.

Durante um interrogatório policial ou judicial, o acusado pode escolher não responder às perguntas formuladas, alegando seu direito ao silêncio. É dever das autoridades respeitar essa decisão e não utilizar o silêncio como um fator para presumir a culpa do indivíduo.

Não podendo ser interpretado como um indício de culpa. O artigo 186 do Código de Processo Penal brasileiro estabelece que o silêncio do acusado não importará em confissão e não poderá ser interpretado em prejuízo da defesa. O objetivo é garantir que o silêncio não seja utilizado contra o acusado e que ele tenha a liberdade de decidir se irá falar ou não durante os procedimentos judiciais.

Além do direito ao silêncio, a presunção de inocência é outro princípio fundamental. Ela estabelece que toda pessoa acusada de um crime é considerada inocente até que sua culpa seja comprovada além de qualquer dúvida razoável. Cabe ao Ministério Público e ao juiz apresentarem provas concretas e convincentes para comprovar a culpa do acusado.

A presunção de inocência garante que o ônus da prova recaia sobre a acusação, e não sobre o acusado. O simples fato de o acusado exercer o direito ao silêncio não pode ser interpretado como uma admissão de culpa ou como elemento determinante para a formação de convencimento do juiz. É necessário considerar a possibilidade de outros fatores que expliquem o silêncio do acusado, como o exercício de seu direito à ampla defesa.

4  DO DIREITO AO SILÊNCIO NO TRIBUNAL DO JÚRI

O direito ao silêncio no Tribunal do Júri é um tema complexo no sistema jurídico. O Tribunal do Júri é responsável por julgar crimes dolosos contra a vida, e durante o julgamento, o réu tem o direito fundamental de permanecer em silêncio. Esse direito está previsto na Constituição Federal e é uma garantia que visa proteger o acusado de autoincriminação.

No Tribunal do Júri, o réu não é obrigado a se manifestar ou a responder a perguntas feitas pela acusação, pelo juiz ou pelo seu próprio advogado. Essa proteção ao silêncio é fundamental para preservar o princípio da não culpabilidade, ou seja, o réu não pode ser considerado culpado apenas pelo fato de permanecer em silêncio (DI GESU, 2021)

A atuação do advogado de defesa desempenha um papel de extrema importância ao orientar o réu sobre as possíveis consequências de exercer o direito ao silêncio. Essa orientação não seria necessária se o nosso ordenamento jurídico fosse rigorosamente seguido. O advogado deve avaliar cuidadosamente as circunstâncias do caso e as estratégias de defesa para decidir se é mais favorável que o réu se manifeste ou permaneça em silêncio.

Destacamos que o silêncio do réu no Tribunal do Júri pode ser interpretado pelos jurados de maneira desfavorável. Isso significa que a ausência de manifestação do réu pode influenciar negativamente a sua defesa. Essa interpretação pode ocorrer devido à expectativa de que o réu apresente sua versão dos fatos e se manifeste em sua própria defesa (LOPES JR., 2018)

O direito ao silêncio no Tribunal do Júri não impede que a defesa apresente provas e argumentos em favor do réu. O silêncio do réu não pode ser interpretado como uma admissão de culpa, e a defesa deve utilizar todos os recursos disponíveis para contestar as acusações e buscar a absolvição do réu.

É frequente encontrar situações em que palavras ditas durante um interrogatório policial são erroneamente acrescentadas ao boletim de ocorrência, desrespeitando assim o princípio da imparcialidade. Mesmo em audiências, algumas palavras proferidas pelos juízes podem introduzir uma notável dose de parcialidade. Um exemplo disso ocorre no início de uma audiência criminal, em que é comum os juízes seguirem a seguinte narrativa: “Gostaria de lhe esclarecer que o senhor tem o direito constitucional de permanecer em silêncio nesse momento, um direito constitucional seu não vai ser prejudicado de nenhuma forma se permanecer em silêncio não quiser responder nenhuma das minhas perguntas.

Porém, eu queria esclarecer também que a oportunidade de senhor apresentar sua versão dos fatos, pode nos esclarecer os fatos, a sua autodefesa. Então lhe questiono, o senhor gostaria de responder?”

A narrativa trazida no início de uma audiência criminal, em que o juiz informa ao réu sobre o direito constitucional de permanecer em silêncio, demonstra a preocupação em garantir o exercício desse direito fundamental. O juiz esclarece que o réu não será prejudicado de forma alguma, caso opte por permanecer em silêncio e não responder às perguntas. Porém o juiz também ressalta a importância da oportunidade de o réu apresentar sua versão dos fatos, pois isso pode esclarecer a situação e contribuir para sua própria defesa.

Essa narrativa reflete um equilíbrio delicado entre o direito ao silêncio e o princípio da ampla defesa. Por um lado, é fundamental garantir que o réu não seja compelido a produzir provas contra si mesmo e que seu silêncio não seja interpretado como sinal de culpa. Por outro lado, o réu tem o direito de se manifestar e apresentar sua versão dos fatos, caso deseje, para exercer plenamente sua defesa.

Analisamos essa narrativa à luz do contexto específico de cada caso, levando em consideração a imparcialidade do juiz e a garantia de um processo justo. A forma como as palavras são proferidas pode influenciar a decisão do réu, causando uma pressão sutil para que ele responda às perguntas. Portanto, é fundamental que o juiz se atente à neutralidade em sua fala e evite qualquer forma de pressão ou intimidação que possa afetar a liberdade do réu de exercer o direito ao silêncio (MARTINS, 2019)

O direito ao silêncio no Tribunal do Júri é uma garantia constitucional que permite ao réu permanecer em silêncio durante o julgamento, sem que isso seja interpretado como uma admissão de culpa. A interpretação do silêncio pelos jurados pode influenciar a percepção da defesa, destacando a importância da atuação estratégica do advogado nesse contexto. A defesa deve buscar equilibrar o direito ao silêncio com a apresentação de argumentos e provas em favor do réu, visando garantir a justiça no processo de julgamento.

O Artigo 186 do Código de Processo Penal é uma disposição legal que trata especificamente do direito ao silêncio no âmbito do Tribunal do Júri. Esse artigo estabelece que o acusado não está obrigado a responder às perguntas que lhe forem formuladas, podendo permanecer em silêncio sem que isso seja interpretado em seu prejuízo (BONFIM, 2017)

No contexto do Tribunal do Júri, o direito ao silêncio ganha uma importância ainda maior, uma vez que esse é o momento em que ocorre o julgamento de crimes dolosos contra a vida, como homicídios e tentativas de homicídio. O júri é composto por cidadãos leigos, os jurados, que têm a responsabilidade de decidir, de forma soberana, sobre a culpa ou inocência do acusado.

Dessa forma, o direito ao silêncio no Tribunal do Júri visa preservar a presunção de inocência e garantir que o acusado não seja prejudicado por sua opção de não se manifestar. Isso significa que o réu tem o direito de escolher não responder a perguntas feitas pela acusação, pelo juiz ou por seu próprio advogado durante o julgamento. O objetivo é evitar que o silêncio seja interpretado como uma admissão de culpa pelos jurados (GALVÃO, 2011)

Embora o acusado tenha o direito ao silêncio, esse direito não impede que a defesa apresente provas, argumentos e testemunhas em seu favor. O advogado do réu pode e deve utilizar todos os recursos disponíveis para contestar as acusações e buscar a sua absolvição.

Fundamental destacar que o silêncio do réu no Tribunal do Júri pode ser interpretado de forma desfavorável pelos jurados. Embora o artigo 186 do Código de Processo Penal estabeleça a proteção ao silêncio, é comum que os jurados, na ausência de explicações do acusado, concluam que a falta de resposta significa uma admissão tácita de culpa. Essa interpretação é decorrente da dinâmica própria do julgamento pelo júri, no qual a fala e a manifestação do réu têm um papel relevante na formação da convicção dos jurados (PREVIDELLI, 2021)

Assim, é incumbência do advogado de defesa analisar estrategicamente o caso, orientar o réu quanto às implicações de exercer o direito ao silêncio e decidir a melhor forma de conduzir a defesa no Tribunal do Júri. É fundamental considerar o contexto específico do julgamento, as provas apresentadas e a dinâmica do júri para definir a estratégia que melhor atenda aos interesses do réu.

Em suma, o Artigo 186 do Código de Processo Penal garante ao acusado o direito ao silêncio no Tribunal do Júri, protegendo-o de ser prejudicado por sua opção de não responder a perguntas durante o julgamento. É necessário ter em mente que o silêncio pode ser interpretado de forma desfavorável pelos jurados, o que enfatiza a importância da atuação estratégica do advogado de defesa nesse contexto. A defesa deve equilibrar o direito ao silêncio com a apresentação de argumentos e provas que favoreçam o réu, a fim de garantir um julgamento justo.

Diante da complexidade do tema e das nuances envolvidas no direito ao silêncio no Tribunal do Júri, é possível concluir que a proteção desse direito fundamental é essencial para preservar o princípio da não culpabilidade e garantir um julgamento justo. O réu tem o direito de permanecer em silêncio durante o julgamento, sem que isso seja interpretado como uma admissão de culpa. Mesmo com o silêncio podendo ser interpretado de forma desfavorável pelos jurados, é fundamental explicar de forma, simples, didática e transparente que em momento algum deve se presumir a culpa do acusado apenas pelo silêncio.

O direito ao silêncio não impede que a defesa exerça plenamente seu papel de contestar as acusações e buscar a absolvição do réu por meio da apresentação de provas e argumentos. Cada caso deve ser analisado de forma individual, levando em consideração as circunstâncias específicas e a dinâmica do júri, para determinar a melhor estratégia de defesa.

A necessidade que o juiz, ao conduzir o julgamento, seja imparcial e garanta a neutralidade em sua fala, evitando qualquer forma de pressão ou intimidação que possa afetar a liberdade do réu de exercer o direito ao silêncio. Dessa forma, é possível buscar o equilíbrio entre o direito ao silêncio e o princípio da ampla defesa, garantindo um processo justo e respeitando os direitos fundamentais do acusado no Tribunal do Júri.

5  CONCLUSÃO

Com base em todas as informações e tópicos abordados neste trabalho, concluímos que o direito ao silêncio e a presunção de inocência são elementos essenciais para garantir um sistema de justiça justo e equitativo. Esse direito fundamental, garantido pela Constituição Federal, busca proteger o acusado de autoincriminação e preservar o princípio da não culpabilidade.

O direito ao silêncio assegura ao acusado o direito de não se incriminar, preservando sua dignidade e protegendo-o de possíveis abusos e coerções durante o processo penal. Ele está ancorado em garantias constitucionais e tratados internacionais, sendo um dos pilares do devido processo legal.

Ao exercer o direito ao silêncio, o acusado não pode ser penalizado ou ter sua culpa presumida com base nessa escolha. É dever das autoridades respeitar essa decisão e não utilizar o silêncio como um indício de culpa. O objetivo é garantir que o acusado possa participar do processo de forma justa, podendo decidir quando falar e quando permanecer calado.

No Tribunal do Júri, o réu não é obrigado a se manifestar ou responder a perguntas formuladas pela acusação, pelo juiz ou pelo seu próprio advogado, porém o silêncio do réu pode ser interpretado de maneira desfavorável pelos jurados, o que pode influenciar negativamente a sua defesa, logo, a atuação estratégica do advogado de defesa é fundamental para orientar o réu sobre as possíveis consequências de exercer o direito ao silêncio e decidir a melhor forma de conduzir a defesa.

A presunção de inocência estabelece que toda pessoa acusada de um crime é considerada inocente até que sua culpa seja comprovada além de qualquer dúvida razoável. Esse princípio coloca o ônus da prova sobre a acusação, exigindo que ela apresente evidências concretas e convincentes para sustentar a culpa do acusado. Esta presunção é fundamental para evitar condenações injustas e garantir que apenas os culpados sejam punidos. Ela reforça a importância de um julgamento imparcial e baseado em fatos, protegendo os direitos e a liberdade do indivíduo durante todo o processo legal.

A garantia do direito ao silêncio não impede que a defesa apresente provas, argumentos e testemunhas em favor do réu. É por meio desses recursos que a defesa busca contestar as acusações e buscar a absolvição do réu. O equilíbrio entre o direito ao silêncio e a apresentação de argumentos e provas se faz necessário para garantir um julgamento justo. É necessário que o juiz, ao conduzir o julgamento, seja imparcial e assegure a neutralidade em sua fala, evitando qualquer forma de pressão ou intimidação que possa afetar a liberdade do réu de exercer o direito ao silêncio. Essa postura preserva a justiça no processo de julgamento. A combinação do direito ao silêncio e da presunção de inocência são pilares fundamentais do sistema de justiça, assegurando a proteção dos direitos e garantias individuais dos acusados. Esses princípios contribuem para um processo penal justo, equilibrado e respeitoso, promovendo a busca pela verdade e evitando violações dos direitos humanos.

O direito ao silêncio no Tribunal do Júri é uma garantia constitucional que visa proteger o acusado e garantir um julgamento justo. A interpretação do silêncio pelos jurados pode ser desfavorável ao réu, destacando a importância da atuação estratégica do advogado de defesa.

A defesa deve equilibrar o direito ao silêncio com a apresentação de argumentos e provas que favoreçam o réu, a fim de garantir um julgamento justo e respeitar os direitos fundamentais do acusado, mas não só a defesa tem este papel como é dever imprescindível que o juiz seja imparcial e neutro em sua condução do processo. Portanto, o tema do direito ao silêncio no Tribunal do Júri é de extrema relevância e merece atenção cuidadosa por parte dos profissionais do direito, a fim de assegurar a efetiva proteção dos direitos dos acusados e a justiça no sistema jurídico.

AGRADECIMENTOS

Gostaria de expressar meus sinceros agradecimentos a Deus, minha família e a todas as pessoas que me apoiaram ao longo da minha trajetória acadêmica. Em especial, quero agradecer ao professor Dr. Ricardo Souza Pereira por sua valiosa contribuição em uma parte crucial do trabalho, fornecendo insights e direcionamento essenciais. Também gostaria de agradecer ao professor Dr. Heitor Romero Marques pelas correções e pela sua didática excepcional em relação às normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas.

Não posso deixar de lado as duas pessoas que me trouxeram para este mundo, cada um com seu jeito de ensinar, minha mãe Me. Paula Alessandra da Silva, professora desta sagrada instituição, coordenadora do curso de Nutrição e Gastronomia, esta sua maneira de lecionar que me ensinou muito de como é a vida e os caminhos que ela oferece, e meu pai José Otávio Correia Fialho, que embora não terminou seus estudos, obtem um talento imensuravel com o que faz, vendedor desde criança e hoje um empresario de renome, enquanto minha mãe ensinou sobre a vida, você me ensinou sobre o mundo e como ele funciona. Eu amo vocês!

Um agradecimento especial ao meu atual chefe e mentor, Dr. José Roberto Rodrigues da Rosa, advogado criminalista, por sua orientação e apoio, se não fosse minha trajetória no seu escritório de advocacia, não iria conseguir discorrer com tanta facilidade e obter tanta experiência neste tema, você é um exemplo para minha jornada acadêmica e um exemplo de profissional. Também sou grato ao meu ex-chefe, o Delegado de Polícia Civil da cidade de Nova Mutum – MT, Rodrigo Rufato, pelo aprendizado e experiência que adquiri sob sua supervisão, antes de entrar na delegacia.

Não poderia deixar de mencionar o meu tio Pós Dr. José Carlos Rosa Pires de Souza por me ajudar sempre em minha vida acadêmica, você também é um exemplo a ser seguido, com tantos livros e artigos publicados com sua autoria ou participação E principalmente a todos os professores desta instituição sagrada, que contribuíram de maneira significativa para minha formação acadêmica e pessoal. Agradeço a cada um de vocês por compartilharem seu conhecimento e por ajudarem a moldar meu percurso na gloriosa Universidade Católica Dom Bosco.

Gostaria de estender meus agradecimentos ao Dr. Carlos Alberto Garcete de Almeida, Juiz da 1ª Vara do Tribunal do Júri da comarca de Campo Grande – MS, que me proporcionou a oportunidade de trabalhar com esse tema. Foi sua ideia primordial e reconheço que não posso reivindicar o mérito por isso. Agradeço por sua inspiração e por abrir essa perspectiva de estudo, o que enriqueceu minha jornada acadêmica.

Minha gratidão a todos que colaboraram de alguma forma nesta jornada de formação.

Seu apoio e contribuição foram fundamentais para o meu crescimento e sucesso.

Muito obrigado!

REFERÊNCIAS

ASSIS, Éder Pereira de. Do conflito entre o direito à produção de provas e o direito à não autoincriminação: nemo tenetur se detegere – no tocante às intervenções corporais. 2ª ed. São Paulo: Editora Dialética, 2022

BECHARA, Fábio Ramazzini. Cooperação Jurídica Internacional em Matéria Penal. São Paulo: Saraiva Educação S.A., 2017.

BITENCOURI, Cezar Roberto. Código penal comentado. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. BITENCOURI, Cezar Roberto. Código penal comentado. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2012.

BITTAR, Eduardo Carlos Bianca; ALMEIDA, Guilherme Assis de. Curso de filosofia do direito. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2004.

BIZZOTTO, Alexandre; SILVA, Denival Francisco da. Acordo de não persecução Penal. São Paulo: Editora Dialética, 2020.

BONFIM, Edilson Mougenot. Júri. Do inquérito ao plenário. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1996.

BONFIM, Edilson Mougenot. Curso de processo penal. São Paulo: Saraiva, 2006.

BONFIM, Edilson Mougenot. Código de Processo Penal Anotado. Saraiva Educação S.A., 2017.

BONFIM, Edilson Mougenot. Júri: Do Inquérito ao Plenário. São Paulo: Saraiva Educação S.A., 2018.

BOTTINO, Thiago. O Direito ao Silêncio na Jurisprudência do STF. Elsevier Brasil, 2009. BUENO, Cassio Scarpinella. Manual de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 2015. CAMPOS, Walfredo Cunha. Tribunal do júri. Teoria e prática. São Paulo: Atlas, 2010.

CAMPOS, Walfredo Cunha. O novo júri brasileiro. São Paulo: Primeira Impressão, 2008.

CARVALHO, Heloísa Rodrigues Lino de. “Permaneceu calado, é culpado! ”: uma análise histórica, normativa, filosófica e cultural do direito ao silêncio. Editora Dialética, 2022.

DI GESU, Cristina. Prova Penal e Falsas Memórias. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2021.

EINOLF, C. J. (2007). The Fall and Rise of Torture: A Comparative and Historical Analysis. University of Virginia.

GALVÃO, L. M. A Prova Psicografada e o Tribunal do Júri. Editora Baraúna, 2011.

GLOECKNER, Ricardo Jacobsen; LOPES JR., Aury. Investigação Preliminar no Processo Penal. São Paulo: Saraiva Educação S.A., 2017.

LIMA FILHO, E. C. Funções da Polícia Judiciária no Processo Penal Brasileiro: O Papel do Delegado de Polícia na Efetivação de Direitos Fundamentais. Editora Thoth, 2020.

LLOYD, Dennis. A ideia de lei. Martins Editora, 2017.

LOPES JR., Aury. Direito processual penal. 16. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. LOPES JR., Aury. Direito processual penal. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

LUPÁRIA, Luca. La Confessione dell’Imputato nel Sistema Processuale Penale. Milano: Dott. A. Giuffrè Editore, 2006.

MARTINS, Cristiano Zanin; MARTINS, Valeska Teixeira Zanin; VALIM, Rafael. Lawfare: uma introdução. Editora Contracorrente, 2019.

MEIRELLES, Flávio. Manual de Direito Processual Penal. 10ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2020.

NUCCI, G. S. (2022). Código de processo penal comentado. 21.ed. Rio de Janeiro: Forense.

PAULO, Beatrice Marinho. Psicologia na Prática Jurídica. São Paulo: Saraiva Educação S.A., 2017.

PREVIDELLI, J.E.A. O Direito Probatório na Corte Interamericana de Direitos Humanos. Editora Appris, 2021.

TÁVORA, Nestor; ROCHA JR., Francisco Monteiro; PACHECO FILHO, Vilmar Velho.

Direito Processual Penal. Curitiba: IESDE Brasil S.A., 2012.

 

1 Universidade Católica Dom Bosco (UCDB). Contato: ca@ucdb.br; (67)3312-3308

2 Orientador temático. Doutorando e Mestre pela PUC/SP, Especialista pela UCDB Professor da Graduação/UCDB e Coordenador da Pós-Graduação em Direito Penal/UCDB. Supervisor do NUPEJU (Núcleo de Pesquisa Jurídica) da UCDB. Conselheiro Federal da OAB pelo MS (2022/2025).

3 Orientador metodológico. Doutorado em Desarrollo local y planificación territorial, Mestre em educação – formação de professores, Especialista em Filosofia e História da Educação, Bacharel em Pedagogia, Licenciado em Ciências Naturais. Lattes: http://lattes.cnpq.br/6681173217974714 ORCID: http://orcid.org/0000-0003-0093-1617Site: www.ucdb.br/docentes E-mail heiroma@ucdb.br