Campo Grande, 17 de abril de 2024
José Serra foi um dos ex-ministros do governo de FHC absolvidos pelo STF
A revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa, promovida pela Lei 14.230/2021, não retroage. Isso não significa, no entanto, que é possível aplicar a norma antiga a casos anteriores à mudança legislativa, mas cuja responsabilização judicial ainda não foi finalizada.
Esse entendimento é da 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal, que extinguiu, em julgamento encerrado última na sexta-feira (12/4), duas ações contra ex-ministros do governo Fernando Henrique Cardoso, além de ex-presidentes e diretores do Banco Central.
As ações foram ajuizadas contra José Serra (Planejamento, Orçamento e Gestão), Pedro Malan (Fazenda) e Pedro Parente (Casa Civil).
A decisão foi tomada em questão de ordem levantada na Reclamação 2.186. O caso foi analisado virtualmente pela 1ª Turma entre os dias 5 e 12 deste mês.
Prevaleceu, por unanimidade, o voto do ministro Alexandre de Moraes, para quem não é possível aplicar dispositivos da versão anterior da Lei de Improbidade Administrativa nos casos em que ainda não há sentença.
As ações questionavam assistência financeira no valor de R$ 2,9 bilhões oferecida pelo Banco Central ao Banco Econômico S.A., em dezembro de 1994, assim como outros atos decorrentes da criação, pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), do Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional (Proer).
Na primeira ação, o MPF pedia a condenação dos ex-ministros ao ressarcimento ao erário das verbas alocadas para pagamento de correntistas de bancos que sofreram intervenção na gestão deles (Econômico e Bamerindus), bem como à perda dos direitos políticos.
A segunda ação envolvia, além de Malan e Serra, Pedro Parente, no período em que foi ministro interino da Fazenda, também os ex-presidentes do Banco Central Gustavo Loyola, Francisco Lopes e Gustavo Franco, e ex-diretores do BC.
Os atos de improbidade teriam ocorrido na modalidade culposa, tal como permitia a LIA de 1992, em vigor quando houve a acusação. A nova lei, de 2021, no entanto, só prevê a ocorrência do ato de improbidade na modalidade dolosa.
Voto
Segundo Alexandre, se por um lado não é possível retroagir a previsão que revogou a modalidade culposa do ato de improbidade, prevista na lei de 2021, por outro não se pode condenar com base na norma anterior, que admitia a modalidade culposa.
“Isso ocorre pelo mesmo princípio do tempus regit actum, ou seja, tendo sido revogado o ato de improbidade administrativa culposo antes do trânsito em julgado da decisão condenatória; não é possível a continuidade de uma investigação, de uma ação de improbidade ou mesmo de uma sentença condenatória com base em uma conduta não mais tipificada legalmente, por ter sido revogada”, disse o ministro.
De acordo com o ministro, a revogação prevista na lei de 2021 não trouxe qualquer previsão de “anistia geral” em favor das pessoas que foram condenadas pela forma culposa prevista na norma anterior, de 1992.
Para ele, o princípio da retroatividade da lei penal, consagrado na Constituição, não tem aplicação automática para a responsabilidade por atos ilícitos civis de improbidade administrativa, por ausência de previsão legal.
No entanto, entendeu ele, havendo revogação expressa da norma que previa a improbidade culposa, mas sem que no caso haja sentença transitada em julgado, “incide a aplicação dos princípios da não extra-atividade da lei”.
“Sem que o fato tenha sido objeto de sentença transitada em julgado, incide o princípio acima mencionado, impedindo-se a continuidade de processos iniciados a partir da imputação da figura culposa da improbidade. Há, assim, um esvaziamento normativo da imputação nas ações de origem, impedindo sua continuidade”, conclui.
Alexandre foi acompanhado pelos ministros Flávio Dino, Cristiano Zanin, Luiz Fux e Cármen Lúcia.
Fonte: Consultor Jurídico