Campo Grande, 14 de março de 2024
Tribunal analisou caso em que servidora pediu benefício porque companheira não teria direito à licença
A licença-maternidade não contempla só a mãe, mas a relação entre mãe e filho e o melhor interesse da criança, que deve ser protegida, como preceitua a Constituição Federal.
Esse entendimento é do Plenário do Supremo Tribunal Federal, que decidiu nesta quarta-feira (13/3), em repercussão geral, que a mãe não gestante em união homoafetiva tem direito à licença-maternidade de 180 dias caso a companheira não tenha usufruído do benefício.
Prevaleceu o voto do relator, ministro Luiz Fux, com um adendo na tese proposto pelo ministro Edson Fachin. Caso a mãe que gerou a criança tenha usufruído do benefício, a não gestante terá direito à licença em período igual ao da licença-paternidade, que é de cinco dias.
A tese proposta por Fux foi acompanhada pelos ministros Flávio Dino, Cristiano Zanin, André Mendonça, Nunes Marques, Edson Fachin, Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso.
O ministro Alexandre de Moraes abriu a divergência para que ambas as mães tivessem direito à licença de 120 dias. Ele foi acompanhado pelos ministros Dias Toffoli e Cármen Lúcia.
Inseminação artificial
O caso concreto é o de um casal de mulheres que fez inseminação artificial. Uma delas forneceu o óvulo, enquanto a outra gestou a criança.
A mulher que forneceu o óvulo, uma servidora pública de São Bernardo do Campo (SP), pediu a licença-maternidade, já que sua companheira é autônoma e não poderia usufruir do benefício.
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) concedeu a licença. O município de São Bernardo entrou com recurso, mas o Supremo rejeitou o pedido contra a decisão do TJ, mantendo a licença.
Voto do relator
Para Fux, a licença é uma proteção garantida pela Constituição e que tem a função de proteger não só a mãe, mas também a criança. Segundo o ministro, a concessão independe da origem da filiação e da configuração familiar.
“As mães não gestantes, apesar de não vivenciarem alterações típicas da gravidez, arcam com todos os demais papéis e tarefas que lhe incumbem após a formação do vínculo familiar.”
O ministro também afirmou que a Constituição incorporou uma concepção plural de família e de arranjos familiares, como a união estável e a família monoparental. Segundo ele, esse modelo plural deve nortear toda a legislação sobre o tema. “Em uma sociedade democrática, a realidade da multidiversidade familiar e todos os seus desdobramentos têm de ser reconhecidos.”
O ministro propôs, e foi acompanhado pela maioria, a fixação da seguinte tese de repercussão geral:
A mãe servidora ou trabalhadora não gestante em união homoafetiva tem direito ao gozo de licença-maternidade. Caso a companheira tenha utilizado o benefício, fará jus à licença pelo período equivalente ao da licença-paternidade.
Divergência
Alexandre divergiu. Segundo ele, as mães não gestantes deveriam ter direito a benefício igual.
O argumento do ministro é que a Constituição estabeleceu uma licença maior para as mães por sua condição de mulheres. Como na união homoafetiva ambas são mulheres, as duas deveriam ter igual período de licença.
O ministro propôs que, assim como na adoção por casais homoafetivos, ambas tivessem direito à licença de 120 dias.
“Tenho amigas promotoras que são casadas. Se elas adotarem, as duas têm direito a 120 dias. Agora, se fizerem inseminação, uma vai ter direito à licença-maternidade e a outra à licença-paternidade? Estamos classificando uma mulher como pai”, afirmou Alexandre.
RE 1.211.446
Fonte: Consultor Jurídico
Foto: Dollar Photo Club