O ministro Antonio Saldanha Palheiro, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), concedeu a ordem em Habeas Corpus para trancar uma ação penal ajuizada contra um advogado que recebeu R$ 700 para ajuizar uma ação, mas não o fez, nem devolveu o dinheiro. Para o ministro, o pagamento de honorários advocatícios para prestação de serviços não executados constitui ilícito civil, reparável na esfera própria. Nada tem a ver, portanto, com a área criminal, nem pode ser tipificado como crime de apropriação indébita.
Segundo as informações, o processo teria o objetivo de obter reparações para sua cliente, que comprou um carro defeituoso em uma concessionária. Ela adiantou os honorários e recebeu por mensagens o número de um processo inexistente e a explicação de que aguardavam a audiência de conciliação. Contudo, diante da demora, ela procurou outro advogado, que descobriu que o processo jamais fora ajuizado e que o prazo para fazê-lo estava perdido. Por isso, ajuizou ação civil de ressarcimento e indenização pela perda de uma chance contra o primeiro advogado.
O patrono, em decorrência dessa situação, acabou sendo denunciado por apropriação indébita, crime descrito no artigo 168, parágrafo 1º, inciso III, do Código Penal. A conduta tipificada foi a de se apropriar de coisa alheia, consistente nos R$ 700 adiantados a título de honorários advocatícios.
Em sua justificativa, o advogado alegou que nunca foi contratado para ajuizar qualquer ação civil em favor da vítima e que tem contra ela uma ação cível de cobrança de honorários advocatícios remanescentes, anterior ao caso em que teria praticado o crime. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) manteve a ação penal por entender que havia prova da materialidade do delito imputado e indícios suficientes de autoria.
No STJ, o ministro Saldanha Palheiro observou que é possível que o advogado pratique apropriação indébita em razão de suas atividades profissionais, quando recebe valores de cliente e não os repassa ou se recusa a restituir a verba. Esse não é o caso dos autos, no entanto. “O pagamento de honorários advocatícios, para prestação de serviços não executados, constitui ilícito civil, reparável na esfera própria. Nada tem a ver com a área criminal. O adiantamento de parte dos honorários somente será considerado apropriação indébita se houver cláusula contratual de devolução expressa, o que não ficou comprovado nos autos.”
O magistrado afirmou ainda que honorário recebido como pagamento de serviços não é coisa alheia devolvível, mas salário pago a profissionais. “Os fatos aqui narrados decorrem do inadimplemento contratual, não traduzem apropriação indébita em razão de ofício, emprego ou profissão.” A concessão da ordem, além de trancar a ação penal, determinou o encaminhamento dos autos para a seccional de São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil.