Campo Grande/MS, 20 de fevereiro de 2025.
A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça decidiu manter a própria competência para processar e julgar a desembargadora Lígia Maria Ramos, do Tribunal de Justiça da Bahia, apesar de ela ter sido aposentada compulsoriamente pelo Conselho Nacional de Justiça.
Nesta quarta-feira (19/2), o colegiado rejeitou o envio do caso para a primeira instância e recebeu a denúncia contra Lígia Maria e outros três acusados pelos crimes de lavagem de dinheiro e organização criminosa.
O processo contra a magistrada é um dos decorrentes de investigação de esquema criminoso na cúpula do Judiciário baiano envolvendo venda de decisões judiciais e grilagem de terras no oeste do estado.
Além de Lígia Maria, também se tornaram réus seus dois filhos, os advogados Arthur Barata e Ruy Barata, e o advogado Júlio César Cavalcanti Ferreira, que foi assessor no TJ-BA. A votação foi unânime.
Pelos mesmos fatos de que é acusada criminalmente, a desembargadora foi aposentada compulsoriamente pelo CNJ em novembro de 2024. O Conselho concluiu que houve conduta contra a administração pública. Foi o que levou o Ministério Público Federal a cogitar o declínio da competência. A regra, hoje, é que o foro especial só vale para fatos imputados a autoridade durante o exercício do cargo e que tenha relação com ele.
Nos casos envolvendo parlamentares, o Supremo Tribunal Federal vem entendendo que o foro privilegiado para investigações só vale enquanto durar o mandato. Em caso de renúncia, cassação ou não reeleição, a apuração vai para a primeira instância.
Competência com o STJ
Quatro motivos levaram o STJ a rejeitar o declínio da competência para o recebimento da denúncia. O primeiro é o fato de que estão pendentes de julgamento embargos de declaração contra o acórdão do CNJ que aposentou compulsoriamente a desembargadora Lígia Maria.
Há dúvidas até sobre o cabimento deles, já que o Regimento Interno do CNJ diz que, das decisões do Plenário, não cabem recursos. O colegiado ainda não se debruçou sobre o pedido.
Assim, a aposentadoria compulsória ainda não é definitiva — apesar de já ter sido confirmada por decreto judicial do Tribunal de Justiça da Bahia.
O segundo motivo é a conveniência de evitar que juízes de primeiro grau baianos julguem uma magistrada que é acusada de integrar um esquema que envolve outros desembargadores, seus superiores na hierarquia do Judiciário.
Para o STJ, isso representa um fator suficiente para inibir a atuação isenta, imparcial e mais tranquila do juízo de primeiro grau.
Enquanto isso, a própria Corte Especial já recebeu denúncias contra outras desembargadoras do TJ-BA — Maria da Graça Osório Pimentel Leal, Sandra Inês Azevedo e Ilona Reis, que inclusive tentou se aposentar voluntariamente, mas foi impedida pelo STJ.
O terceiro motivo se relaciona com o segundo: o inquérito contra a desembargadora Lígia Maria está intrinsecamente conectado às outras ações penais derivadas da investigação, o que recomenda que sejam todas julgadas no mesmo local.
Por fim, a orientação vigente sobre o foro especial está prestes a ser alterada. O Plenário do Supremo retomará no próximo dia 28 o julgamento virtual de um Habeas Corpus sobre o tema. Nele, já há maioria formada para concluir que a prerrogativa de foro deve ser mantida nos casos de crimes cometidos no cargo e em razão dele, após a saída da função.
Mantida a competência da Corte Especial, o colegiado acompanhou por unanimidade o relator do inquérito, ministro Og Fernandes, na decisão de receber a denúncia. A conclusão é de que há indícios de autoria e materialidade suficientes para o trâmite da ação penal.
Inq 1.658
Fonte: https://www.conjur.com.br/2025-fev-20/stj-mantem-foro-de-desembargadora-aposentada-pelo-cnj-e-recebe-denuncia/