Discriminação racial e social no porte de drogas: um debate histórico no STF

Campo Grande, 21 de junho de 2024

Por Patrícia Azevedo

Advogada Patrícia Azevedo

A sociedade brasileira é marcada por profundas desigualdades sociais e raciais, refletidas também no sistema carcerário. Atualmente, 66,7% da população prisional é composta por homens jovens, negros e de baixa escolaridade. Apesar de a lei dever ser aplicada de maneira equânime, a realidade mostra que pessoas negras e periféricas enfrentam um tratamento mais severo comparado a indivíduos brancos e de classes sociais mais altas. Essa seletividade penal é documentada em dados estatísticos que mostram uma maioria significativa de negros encarcerados, especialmente em casos de porte e uso de drogas, onde a discriminação racial e social é evidente devido à aplicação discriminatória da lei.

A Lei de Drogas (Lei nº 11.343/2006) prevê tratamento diferenciado entre usuários e traficantes, contudo, a interpretação subjetiva da lei frequentemente leva à discriminação. Jovens negros e moradores de periferias são frequentemente enquadrados como traficantes, enquanto jovens brancos, de classes mais altas, são tratados como usuários em situações similares ou até mais graves.

Hoje, 20 de junho, o Supremo Tribunal Federal (STF) realiza um julgamento histórico para mitigar a discriminação no tratamento penal relacionado ao porte de drogas. Importante esclarecer que a discussão não trata da legalização do uso da maconha; uso e tráfico de drogas continuarão sendo crimes.

O objetivo é garantir uma justiça não discriminatória na aplicação da lei, onde um pobre, com pequena quantidade de droga, não seja classificado como traficante enquanto um rico, com quantidade maior, é tratado como usuário. A classe social tem desempenhado um papel determinante na aplicação da Lei de Drogas, privilegiando certos indivíduos em detrimento dos mais pobres, que enfrentam dificuldades desde a tipificação do crime até o julgamento, com menor chance de obter uma defesa eficaz.

A discussão no STF sobre a discriminação na aplicação da Lei de Drogas é um passo significativo para promover justiça equânime. O debate levantado pelo STF é de grande relevância e plausibilidade, buscando balancear e minimizar essas questões preconceituosas enraizadas na sociedade. E reconhecer que a lei perpetua desigualdades raciais e sociais ainda que subjetivamente, é essencial para construir um sistema penal mais justo. A mudança visa garantir que a justiça seja aplicada igualmente para todos os cidadãos, independentemente de cor ou classe social.

Sem sombra de dúvidas, o julgamento no STF é um marco na luta contra a discriminação racial e social no Brasil. Não se trata de legalizar a maconha ou descriminalizar o porte ou tráfico de drogas, mas de revisar a aplicação da lei para assegurar que a justiça seja aplicada de forma justa e imparcial. Superar as desigualdades no sistema penal é fundamental para construir uma sociedade mais justa e equitativa, onde todos tenham seus direitos garantidos sem discriminação. Acredito firmemente que essa iniciativa do STF é essencial para promover uma justiça verdadeiramente equânime no país.

 

Referências[1]

Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN). Relatório de Dados sobre a População Carcerária. Brasília: DEPEN, 2023.

Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Atlas da Violência 2023. Brasília: IPEA, 2023.

Pesquisa de Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (INFOPEN). Dados sobre Encarceramento e Raça. Brasília: INFOPEN, 2023.

[1] https://www.migalhas.com.br/quentes/409644/stf-retoma-debate-de-descriminalizacao-do-porte-de-drogas-nesta-quinta