Ato de policial apenas “ratificar” em audiência o que foi dito em delegacia não pode servir como prova

Campo Grande, 06 de junho de 2024
Para Turma, absolvição é medida que se impõe quando não há acervo probatório produzido sob o crivo do contraditório e da ampla defesa

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, em decisão recentíssima, considerou que a mera ratificação dos depoimentos policiais prestados na fase inquisitorial não pode servir de prova para condenar o acusado. No caso, testemunhas policiais declararam que não se recordavam do caso e apenas ratificaram as declarações prestadas perante a autoridade policial.

Para o juízo do caso e o Tribunal de Justiça do Espírito Santo, a ratificação serviria como prova para condenar. Para a 6ª Turma, não.

Por que isso é importante?

Boa parte dos processos criminais (principalmente os de tráfico) que tramitam no Brasil possuem como alicerce único os depoimentos dos policiais que participaram da diligência.

  • Ocorre que, não raramente, dada a carga de trabalho e a limitação da memória humana, policiais chegam nas audiências com uma vaga lembrança ou mesmo sem se lembrarem do que ocorreu.
  • Daí, duas opções surgem para o magistrado que conduz o caso: a) Assumir que o policial não se lembra e encerrar o processo ou b) permitir que o policial leia o que foi dito na delegacia no dia dos fatos e apenas “ratifique”.
  • A ‘opção 2’ quase sempre é escolhida.
  • Ocorre que uma condenação criminal pressupõe a existência de provas previamente submetidas ao contraditório efetivo, e não de uma mera reprodução em juízo.
  • Quando a “ratificação” do que foi dito na delegacia é aceito como prova para condenar, se está, ainda que por via oblíqua, aceitando que elementos produzidos sem o crivo do contraditório e da ampla defesa valham como provas, o que há muito já foi rechaçado pela jurisprudência e pela lei.

A decisão do STJ

No recentíssimo AgRg no AREsp 2153167, a Sexta Turma do STJ entendeu desta forma ao considerar que a mera confirmação do que foi dito pelos policiais na fase inquisitorial não servia como prova.

  • “Não se admite, no ordenamento jurídico pátrio, a prolação de um decreto condenatório fundamentado, exclusivamente, em elementos informativos colhidos durante o inquérito policial, no qual inexiste o devido processo legal (com seus consectários do contraditório e da ampla defesa)”, concluiu o relator, ministro Jesuíno Rissato (desembargador convocado do TJDFT).
  • “No caso, apesar de evidenciada a materialidade delitiva, não foi produzida prova judicializada apta a comprovar a autoria do delito, porquanto as testemunhas policiais, quando ouvidas em juízo, declararam não se recordar dos fatos, tendo apenas ratificado o teor das declarações prestadas perante a Autoridade policial, mediante confirmação de suas assinaturas no termo de depoimento de condutor”, assentou a Turma.

O recurso foi provido para, com base no princípio do “in dubio pro reo”, absolver o acusado pelo crime de tráfico de drogas.

Fonte: Síntese Criminal