A importância da sustentação oral em agravo regimental

Campo Grande, 03 de abril de 2024

Uma questão de acesso à justiça e constitucionalidade

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Advogado João Godoy

Por: João Godoy

Na última sessão de julgamento da 1ª Turma do STF, ocorrida em 02 de abril de 2024, o renomado advogado Alberto Zacarias Toron trouxe à atenção do Ministro Alexandre de Moraes uma alteração significativa no Estatuto da Advocacia. Essa mudança, respaldada por lei federal, concede aos advogados o direito de realizar sustentação oral em agravo regimental nos recursos interpostos contra decisões monocráticas de relatores que julguem o mérito ou não reconheçam determinados recursos e ações.

Contudo, o Ministro Alexandre de Moraes, ressaltou que o Regimento Interno, considerado legislação especial, prevalece sobre o Estatuto da Advocacia, impedindo, assim, os advogados de efetuarem a sustentação oral. Vale destacar a ocorrência de inúmeros casos nos quais os advogados foram impossibilitados de exercer esse direito em agravo regimental, evidenciando a relevância e a urgência do debate sobre o tema.

É de extrema relevância ressaltar que, em um julgamento datado de 11 de abril de 2023, a 1ª turma do STF, ainda sob a presidência do Ministro Barroso, tomou uma decisão notável ao permitir uma sustentação oral, de forma excepcional, para um promotor de justiça do estado do Tocantins. Este evento estabeleceu um precedente significativo, demonstrando que, é possível abrir espaço para a manifestação oral de argumentos por parte de representantes do Ministério Público.

No entanto, esse precedente levanta questionamentos pertinentes sobre a equidade no tratamento entre os membros do Ministério Público e os advogados. Por que há uma diferenciação na possibilidade de realização de sustentação oral entre esses dois grupos? Afinal, como garantir a justiça e a imparcialidade quando uma das partes envolvidas é sistematicamente impedida de se expressar plenamente perante os tribunais?

A vedação da sustentação oral aos advogados representa não apenas uma disparidade injustificável, mas também um retrocesso perigoso no que diz respeito aos direitos fundamentais dos profissionais da advocacia.

Ao longo do tempo, temos observado uma tendência preocupante de restrição do direito dos advogados de se manifestarem oralmente no STF. Essa limitação desafia os princípios fundamentais de igualdade processual e acesso à justiça.

É válido mencionar que a origem do verbo advogar fornece uma compreensão clara sobre o papel do advogado: originado do latim “advocatus”, que literalmente significa convocar para junto de si, ou chamar para auxílio. Advogar é dar voz a quem precisa ser ouvido, fomentando a justiça e atuando como suporte fundamental para a melhoria da qualidade de vida de outrem.

Portanto, ao restringir a possibilidade da sustentação oral em determinados casos, o sistema judicial não apenas contradiz a própria essência do verbo “advogar”, mas também compromete a realização plena da justiça e o acesso equitativo à mesma.

Desde a promulgação da Lei 14.365/2022, que permite aos advogados realizar sustentação oral em agravo regimental, temos testemunhado um debate acalorado sobre sua validade frente ao Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (STF), que veda tal prática.

Vejamos, o que versa Art. 7º, § 2º-B, do Estatuto da Advocacia, com recente alteração em alguns artigos pela lei Lei 14.365/2022:

Art. 7º São direitos do advogado:

2º-B: Poderá o advogado realizar a sustentação oral no recurso interposto contra a decisão monocrática de relator que julgar o mérito ou não conhecer dos seguintes recursos ou ações:      

I – recurso de apelação;     

II – recurso ordinário;       

III – recurso especial;       

IV – recurso extraordinário;      

V – embargos de divergência;      

VI – ação rescisória, mandado de segurança, reclamação, habeas corpus e outras ações de competência originária.

A controvérsia levanta reflexões não apenas sobre a interpretação da lei, mas também sobre questões constitucionais e o papel do advogado no sistema jurídico.

É essencial destacar que a proibição da sustentação oral em agravo interno vai de encontro a princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito, especialmente o direito ao contraditório e à ampla defesa. Ao negar ao advogado a oportunidade de apresentar oralmente seus argumentos, o sistema judicial compromete a qualidade das decisões, pois priva as partes de uma ferramenta crucial para a defesa de seus direitos.

Ademais, a proibição da sustentação oral em agravo interno pode ser questionada por sua inconstitucionalidade. A Constituição Federal assegura o direito à ampla defesa e ao contraditório, bem como o princípio da igualdade processual. Restringir a possibilidade de sustentação oral fere tais princípios, pois cria uma assimetria entre as partes, privilegiando uma em detrimento da outra.

Além disso, é importante reconhecer que a sustentação oral é uma ferramenta crucial para a garantia da efetividade do direito de defesa. Permitir que os advogados se manifestem oralmente durante os processos judiciais não apenas contribui para uma melhor compreensão dos argumentos apresentados, mas também confere legitimidade ao processo, garantindo que todas as partes tenham voz e sejam ouvidas.

Nesse sentido, é fundamental que a interpretação da lei seja feita de maneira a garantir o pleno exercício do direito de defesa e a observância dos princípios constitucionais. A jurisprudência deve evoluir de forma a adaptar-se aos novos contextos e às demandas da sociedade, assegurando que o acesso à justiça não seja cerceado por formalismos inconstitucionais.

Em suma, a possibilidade do advogado realizar sustentação oral em agravo regimental não apenas está em conformidade com os princípios constitucionais, mas também é essencial para garantir um processo judicial justo e equitativo. Negar aos advogados esse direito é negar-lhes a oportunidade de cumprir seu papel fundamental na defesa dos direitos de seus clientes e, consequentemente, contrariar a própria essência do sistema jurídico democrático.

Ao final da sessão realizada no dia 02 de abril, o causídico Alberto Zacarias Toron encerrou brilhantemente dizendo: “Este tema é da maior relevância, o tribunal só se eleva ouvindo outras vozes“.

Essas palavras ressaltam a importância da diversidade de perspectivas e da garantia do direito à sustentação oral como um meio vital para promover a justiça e a equidade no sistema jurídico.