Projeto que regulamenta HC coletivo de ofício é um avanço, dizem criminalistas

Para criminalistas, projeto que regulamenta HC coletivo de ofício é grande avanço

Aprovado pelo Senado Federal nesta quarta-feira (21/2), o projeto (PL 3.453/2021) que favorece o réu na esfera penal quando houver empate em julgamentos nos tribunais superiores, além de alterar as regras para a concessão de Habeas Corpus de ofício, será um grande avanço para o Direito Penal brasileiro, caso seja transformado em lei — o texto agora voltará para a Câmara dos Deputados.

Essa é a opinião dos criminalistas consultados pela revista eletrônica Consultor Jurídico. Eles destacaram a formalização do princípio in dubio pro reo (na dúvida, a favor do réu) nas cortes superiores e a ampliação da concessão de HCs de ofício, o que contemplará também o HC coletivo.

O advogado, professor e parecerista Lenio Streck considerou positiva a aprovação do PL. “É importante deixar isso bem claro: o projeto diz o óbvio. Mas no Brasil o óbvio tem de ser tirado do esconderijo. Desde a mitologia grega o empate favorece o réu, como se pode ver no julgamento de Orestes, peça de Ésquilo. E a concessão (de HC) de ofício, já usada na prática, agora fica explicitada.”

O criminalista Alberto Toron acredita que o projeto é importante não porque abre a possibilidade de concessão de Habeas Corpus de ofício — que já era prevista no Código de Processo Penal de 1941. Para ele, o mais relevante é a inclusão no texto legal do HC coletivo.

“Os juízes e os tribunais têm competência para expedir de ofício a ordem de Habeas Corpus quando no curso do processo verificarem que alguém sofre ou está na iminência de sofrer com ação ilegal. Nesse ponto, não há novidade alguma, quer dizer, o artigo 647-A repete o que está no Código de Processo Civil, no parágrafo 2º do artigo 654. A diferença é que o 647-A, que consta no projeto de lei, fala expressamente em Habeas Corpus individual ou coletivo. Então, é o legislador reconhecendo pela primeira vez a existência do HC coletivo, coisa que até hoje só é feita pela jurisprudência, tanto do Superior Tribunal de Justiça quanto do Supremo Tribunal Federal.”

O professor de Processo Penal do IDP e criminalista Luís Henrique Machado aponta que, caso o PL seja convertido em lei, o novo regramento poderá significar uma pá de cal em uma jurisprudência oscilante do STF. “Não será mais possível os magistrados entenderem pela aplicação do princípio in dubio pro societate (na dúvida, pela sociedade) em fase de recebimento de denúncia para justificar a instauração da ação penal em caso de empate na votação, pois o projeto é claro em sua redação no sentido de que abrange todos os julgamentos em matéria penal.”

Ajuste de contas

A maior clareza dada pelo PL ao princípio in dubio pro reo é um dos pontos destacados pelo advogado e professor Aury Lopes Jr.

“Trata-se de uma importante evolução. Mais do que isso: é um ajuste de contas em relação aos erros do passado. Era um grande erro decidir-se para o réu apenas em caso de empate no julgamento de Habeas Corpus, como muitos faziam. É um princípio milenar de que a dúvida deve — sempre — decidir em favor do réu. Portanto, agora se corrige esse problema para que o empate no julgamento colegiado de qualquer recurso seja decidido a partir do in dubio pro reo.

O professor da FGV-SP e sócio da área penal do escritório Matto Filho Rogério Taffarello destaca a legitimidade que o projeto confere à possibilidade de concessão de HC coletivo de ofício. “É uma figura ainda relativamente nova, que não está prevista na lei, mas decorre de uma construção recente do Supremo. Foi uma decisão, aliás, histórica do início de 2018 do Supremo Tribunal Federal, relatada pelo então ministro Ricardo Lewandowski, hoje nosso ministro da Justiça, que pela primeira vez concedeu uma ordem coletiva de HC em favor de todas as mulheres em prisão cautelar que fossem gestantes ou mães de crianças até 12 anos. Ali foi o primeiro HC coletivo e hoje a gente vê o legislador tutelando a possibilidade de HC coletivo nessa reforma em vias de ser sacramentada no CPP, o que em si é também um grande avanço, muito significativo a meu ver.”

PL 3.453/2021

 

Fonte: Consultor Jurídico

Foto: Leonardo Sá/Agência Senado