O mandado de busca e apreensão não pode ser vago em relação aos seus alvos e ainda tem que definir o que se pretende encontrar, sob pena de a diligência se tornar nula, bem como as provas dela decorrentes. Além disso, o eventual encontro de objetos ilícitos nessas circunstâncias não elimina a ilegalidade inicial e nem valida a investigação.
Com essa fundamentação, a 7ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) deu provimento ao recurso de apelação de um empresário de Santos e o absolveu. Embora não fosse a pessoa citada no mandado, que tem o seu mesmo prenome, o apelante teve a sua casa revistada, onde havia uma pistola calibre 380 e R$ 321 mil.
“Ausente qualquer conexão entre o réu apelante e o destinatário do mandado de prisão, busca e apreensão. Ausentes no caso elementos indicativos concretos de que os agentes estatais pudessem localizar e apreender os referidos bens se não houvesse o cumprimento do mandado de prisão sob exame”, anotou a desembargadora Ivana David.
Relatora da apelação, a julgadora acolheu a preliminar de nulidade sustentada pelo advogado William Cláudio Oliveira dos Santos e absolveu o réu com base no artigo 386, inciso II, do Código de Processo Penal (não haver prova da existência do fato). A defesa alegou ilegalidade na busca e apreensão porque o mandado de se refere a terceiro.
A juíza Silvana Amneris Rôlo Pereira Borges, da 6ª Vara Criminal de Santos, havia absolvido o réu pela lavagem de dinheiro e o condenado a dois anos de detenção pela posse ilegal de arma. Essa pena foi substituída por prestação de serviço comunitário pelo mesmo período e pelo pagamento de prestação pecuniária de 50 salários mínimos.
O homem mencionado no mandado de prisão foi condenado em ação ajuizada em Guarujá, referente aos delitos de tráfico de drogas, associação para o tráfico, lavagem de dinheiro e organização criminosa, estando foragido. Ao contrário, o seu xará empresário, é primário. Os dois sobrenomes de ambos os homens são bem diferentes entre si, o que afasta a hipótese de confusão.
Jurisprudência do STJ
Ivana David citou em sua decisão julgados do Superior Tribunal de Justiça. Sob a relatoria do ministro Sebastião Reis Júnior, uma delas destaca ser “indispensável que o mandado de busca e apreensão tenha objetivo certo e pessoa determinada, não se admitindo ordem judicial genérica e indiscriminada” (AgReg no HC 435.934/RJ).
Em outra decisão do STJ (HC 663.055/MT), o ministro relator Rogerio Schietti Cruz assinala que “o agente responsável pela diligência deve sempre se ater aos limites do escopo, vinculado à justa causa, para o qual excepcionalmente se restringiu o direito fundamental à intimidade”.
Sob a justificativa de ter recebido “denúncia anônima” sobre o paradeiro do condenado foragido, o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público, requereu o mandado de busca e apreensão. Para o cumprimento da ordem judicial, promotores contaram com o apoio de policiais militares.
Segundo a julgadora, o relatório do próprio Gaeco sobre o cumprimento do mandado, referente ao processo sentenciado de Guarujá, destacou que a arma e o dinheiro apreendidos “não guardavam relação direta com a ação penal que tramita perante este juízo, e a sua apuração será feita de forma autônoma, no bojo do inquérito policial já instaurado”.
De acordo com Ivana David, a descoberta posterior de uma situação de flagrante delito resultou de ingresso ilícito na moradia do apelante, em violação da norma constitucional que consagra direito fundamental à inviolabilidade do domicílio. Desse modo, a prova obtida ilicitamente e todos atos dela derivados são “imprestáveis”.
A relatora baseou o seu voto na teoria dos frutos da árvore envenenada, cujo suporte é o artigo 5º, inciso LVI, da Constituição Federal (são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos). Os desembargadores Mens de Mello e Fernando Simão a seguiram.
Conforme o acórdão, para a “apuração dos fatos e eventual tomada de providências cabíveis”, cópias dos autos foram remetidas ao MP. Em razão da decisão do colegiado, o advogado do recorrente irá pleitear a restituição da arma de fogo e do dinheiro apreendidos.
Processo 1500918-78.2017.8.26.0536
Fonte: Consultor Jurídico
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