STJ decide que seus próprios acórdãos não interrompem a prescrição punitiva

Os acórdãos dos tribunais superiores que confirmam a condenação do réu ou a decisão de pronúncia não servem para interromper o curso da prescrição da pretensão punitiva.

Essa conclusão é da 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que na última terça-feira (5) deu contornos à interpretação do artigo 117, incisos III e IV, do Código Penal. O resultado foi por maioria de votos.

As normas tratam da prescrição do direito de punir alguém. Esse prazo se interrompe pela decisão confirmatória da pronúncia (em caso de crime doloso contra a vida) ou pela publicação da sentença ou do acórdão condenatório recorrível.

Em 2020, o Supremo Tribunal Federal decidiu que as sentenças colegiadas que apenas confirmam a condenação do réu também interrompem a prescrição. O caso foi julgado no HC 176.473.

Na época, faltou decidir se esse entendimento só vale para as decisões confirmatórias dos tribunais de apelação, em que ainda é possível a análise de fatos e provas para estabelecer a culpa do acusado, ou se é aplicável também quando os recursos chegam ao STJ e ao STF.

Por 3 votos a 1, prevaleceu na 5ª Turma do STJ a interpretação mais restritiva e benéfica ao acusado. O voto vencedor, do ministro Reynaldo Soares da Fonseca, foi acompanhado pelos ministros Joel Ilan Paciornik e Messod Azulay. Ficou vencido o ministro Ribeiro Dantas.

Não interrompe

A ideia é que não é possível, nem recomendável, inserir, como regra, uma decisão proferida pelo STJ como marco interruptivo da prescrição, quer no inciso III, quer no inciso IV do artigo 117 do CP.

Esses dispositivos devem ser interpretados restritivamente porque guardam estreita relação com a formação da culpa, que não é propriamente examinada nos recursos para os tribunais superiores.

Segundo o ministro Reynaldo, os recursos interpostos ao STJ não confirmam propriamente a decisão de pronúncia ou mesmo uma sentença condenatória, uma vez que não cabe o exame dos fatos que levaram à condenação.

“O que se tem é analise a respeito da observância da legislação infraconstitucional”, explicou o magistrado. Ou seja, se a pronúncia ou condenação já foi confirmada em segundo grau, não há necessidade de nova confirmação pelos recursos.

“O STJ não pode ser considerado uma terceira instancia recursal”, ressaltou o ministro Reynaldo Soares da Fonseca, no voto vencedor.
Ele ainda destacou que existe uma única hipótese de interrupção da prescrição: se a pronúncia ou condenação de primeiro grau for derrubada pela decisão do tribunal de apelação, e, em seguida, restabelecida pelo STJ.

Caso concreto

No caso julgado, a concessão da ordem de ofício para afastar a interrupção da prescrição significou que o acusado de um homicídio em Guarulhos não poderia ser punido pelo crime se chegasse a ser julgado, o que não ocorreu.

Ele foi representado no STJ pelos advogados Alberto Zacharias Toron e Renato Martins. Eles defenderam a tese de que as causas de interrupção da prescrição são taxativas e restritivas.

O réu ainda foi beneficiado pelo fato de já ter mais de 70 anos. Com isso, a prescrição da punibilidade é contada pela metade.

No caso, o crime ocorreu em 2001; a denúncia foi recebida 2003; a pronúncia, feita em 2010; a confirmação pelo TJ-SP, em 2012; e a decisão do STJ, em 2020.

Voto vencido

Ficou vencido o ministro Ribeiro Dantas, relator do HC, que defendeu que o acórdão do STJ também serve para interromper o curso da prescrição da pretensão punitiva, desde que o recurso tenha sido conhecido pelo órgão julgador.

Em sua análise, o vocábulo “decisão”, inserido no inciso III do artigo 117 do CP, abrange todas as espécies de pronunciamentos judiciais, inclusive os feitos pelo STJ.

Para o relator, a tese do STF sobre a interrupção da prescrição teve como objetivo evitar que a perpetuação do processo por recursos interpostos, inclusive nas instâncias superiores, redunde em prescrição da pretensão punitiva.

“No caso concreto, temos alguém que pratica um crime doloso contra a vida e não tem condenação, porque precisa passar pela pronúncia. Então ele já começa a recorrer da pronúncia. Se não houver decisões com essa força interruptiva, ele talvez possa obter a prescrição por meio de recursos muito delongados”, explicou o relator.

HC 826.977

Fonte: Consultor Jurídico

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