Nem de esquerda, nem de direita: o que é o garantismo?

(Fábio Trad Filho – Advogado e Mestre em Direito Penal pela UFMS)

 

José Dirceu e Flávio Bolsonaro foram processados criminalmente e representados por competentes advogados criminalistas.

As imputações, embora diferentes no conteúdo, foram veementemente refutadas por ambos na afirmação categórica de que não correspondiam à realidade, razão por que deveriam ser julgadas improcedentes.

Independentemente do desfecho das ações penais, um ponto uniu as respectivas defesas: a busca tenaz pela aplicação dos postulados garantistas no transcurso da ação penal.

Postulados garantistas são comandos axiológicos supraconstitucionais legitimados por normas internacionais voltadas às garantias inegociáveis que dão concretude aos direitos humanos.

Estado na sua totalidade institucional e o indivíduo se colocam frente a frente quando o limite da liberdade, em tese, é ultrapassado por quem deveria se conter no círculo da legalidade. Neste exato instante, instala-se um conflito de interesses no qual a força do Estado constrange a vontade do indivíduo para que aquele possível abuso do exercício de liberdade seja respondido com uma restrição a esta mesma liberdade mal exercitada.

Ocorre que este conflito de interesses tem regras, princípios, valores, axiomas, postulados e garantias que disciplinam a forma como o constrangimento estatal deve ser exercido sobre a liberdade do indivíduo.

O descompasso milimétrico de quaisquer destes limites faz disparar o alarme universal das garantias dos direitos do Homem (1789, 1948).Todos são feridos com o ferimento de um só privado de direitos quando confrontado com a força do Estado.

A jornada afirmativa da concretização dos postulados garantistas é uma escada de degraus diários. Seu topo jamais será alcançado se a leniência dos acomodados transigir com as violações perpetradas pela estrutura do Estado. Urge contestar, reclamar, pugnar, combater, apontar, responder e denunciar com a máxima indignação qualquer sombra que venha eclipsar o brilho do estuário garantista.

A razão é simples: o garantismo não é José Dirceu, tampouco Flávio Bolsonaro; o garantismo deflui do princípio da dignidade humana, postulado supraconstitucional que fundamenta todos os demais princípios.

Portanto, o garantismo é uma franquia constitucional que dialoga com a necessidade de conter o voraz apetite punitivo do Estado. Sendo apetite, a tendência é devorar direitos. O garantismo é a espinha que tranca a garganta de quem se aproxima da fome insaciável. Não fossem os limites garantistas, todos estaríamos no estômago do monstro, incluindo no bolo alimentar a direita, o centro e a esquerda.

Ser garantista é ser civilizado !